Cientistas alertam para impacto da mineração no fundo do mar

No dia 9 de julho de 2023, o fundo do oceano pode se tornar aberto à mineração, sem que a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (da sigla em inglês ISA) tenha conseguido produzir qualquer regulamentação após dois anos de negociação. O impacto desta decisão pode ser gigantesco e irreversível.

De acordo com um novo relatório do think tank financeiro sem fins lucrativos britânico Planet Tracker , a mineração nas profundezas do oceano pode causar até 25 vezes mais perda de biodiversidade do que a mineração terrestre , informou a Reuters. E o custo financeiro de reparar esse dano seria o dobro de extraí-lo.

“Os principais impactos indiretos da mineração em alto mar estão associados às plumas de sedimentos e ao ruído criado pela atividade de mineração, que pode ter impactos de longo alcance nos ecossistemas oceânicos. Por exemplo, as comunidades do fundo do mar podem ser sufocadas, metais tóxicos podem ser liberados, a pesca em alto mar pode ser contaminada e nutrientes podem ser introduzidos em ecossistemas pobres em nutrientes. Embora esses impactos estejam relativamente sob estudo, a pesquisa existente indica que eles provavelmente serão muito difíceis de controlar e conter devido à natureza dinâmica e altamente interconectada do oceano”, diz o relatório.

O relatório, “The Sky High Cost of Deep Sea Mining”, disse que o processo de mineração destrutivo em águas internacionais afetaria uma região da biosfera igual a mais volume do que toda a água doce do planeta. A perda de biodiversidade também pode ser irreversível, alertou o Planet Tracker.

A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) se une ao Planet Tracker neste alerta e defende que “a mineração em alto mar deve ser interrompida até que os critérios especificados pela IUCN sejam atendidos, incluindo a introdução de avaliações, regulamentação efetiva e estratégias de mitigação”.

Os regulamentos para a mineração do fundo do oceano em águas internacionais pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos das Nações Unidas, com sede na Jamaica, são esperados para o próximo mês. “O lobby pró-mineração do fundo do mar está criando sua própria narrativa, optando por retratar apenas parte do que sabemos e não sabemos. Eles estão vendendo uma história de que as empresas precisam de minerais do fundo do mar para produzir carros elétricos, baterias e outros itens que reduzem as emissões de carbono ”, disse Jessica Battle, líder da No Deep Seabed Mining Initiative do WWF, de acordo com um comunicado de imprensa do WWF de 2021.

“Mas empresas inteligentes que estão comprometidas com a sustentabilidade estão enxergando essa falsa narrativa. A mineração no fundo do mar é um desastre ambiental evitável. Podemos descarbonizar por meio da inovação, redesenhando, reduzindo, reutilizando e reciclando”, disse Battle.

Entenda o caso

Apesar da dimensão dos riscos que a mineração em águas profundas traz, a sua aprovação pode acontecer por uma “falha no calendário”. A legalização viria do esgotamento do prazo para regulamentar um pedido de Nauru, um país insular do Pacífico, em favor de uma mineradora canadense com projeto previsto para 2024. A próxima reunião da ISA será no dia seguinte ao encerramento do prazo, em 10 de julho, e os países serão forçados a decidir se querem prosseguir com a aprovação das licenças, fazer uma pausa preventiva (moratória) ou implementar uma proibição parcial ou total da mineração em alto-mar.

As evidências científicas disponíveis indicam que a perturbação do fundo do oceano e de seus ecossistemas pouco estudados certamente terá impactos duradouros sobre a biodiversidade e o clima. Um pequeno número de empresas de mineração alega que isso é necessário para atender à crescente demanda por tecnologias renováveis, mas os cientistas afirmam que isso é falso, pois há recursos suficientes em terra, especialmente com o aumento da reutilização e da reciclagem.

Desnecessária, indesejável e arriscada

Em comunicado enviado à imprensa internacional, Deep Sea Conservation Coalition (DSCC), uma coalizão de mais de 100 ONGs traz três argumentos para que a mineração no fundo do oceano não seja autorizada:

A mineração em alto mar não é necessária.

Não precisamos abrir nosso oceano para a maior operação de mineração da história da humanidade neste momento de emergência planetária para alimentar a transição de energia limpa. O caminho mais sustentável – e muito menos arriscado – é usar muito melhor os metais que já temos enquanto aceleramos a próxima geração de baterias mais limpas, o que deve reduzir a demanda por esses metais. Enquanto isso, seria melhor se concentrar em melhorar a mineração terrestre do que expandir a mineração para o oceano.

A mineração em alto mar não é desejada.

Ampliar a mineração para o fundo do oceano vai contra os esforços globais para realinhar nossos sistemas para que eles operem dentro dos limites da natureza. A ciência é clara sobre a necessidade de proteger urgentemente o oceano doente das pressões humanas para que ele possa continuar a nos sustentar. Não faz sentido desencadear uma nova indústria extrativa em grande escala que traria lucro para um grupo muito pequeno e impactos negativos para o planeta e para a humanidade. É por isso que uma onda crescente de governos, parlamentares, cientistas, indústria pesqueira, empresas, sociedade civil e comunidades locais estão pedindo o fim dessa indústria destrutiva antes que ela comece.

A mineração em alto mar não vale o risco.

Abrir nosso oceano para a mineração seria uma aposta planetária irresponsável. Sabemos que as consequências da extração de metais e minerais no fundo do oceano serão terríveis – destruirá irreversivelmente habitats importantes, eliminará espécies em grande escala e correrá o risco de perturbar o armazenamento de carbono inestimável. No entanto, ainda não podemos prever a extensão total de seus impactos porque sabemos muito pouco sobre essa área complexa do nosso planeta ou como ela funciona. Se essa aposta perigosa der errado, corre o risco de desencadear um efeito dominó que pode desestabilizar o oceano, causar extinção de espécies e destruição de habitats e impactar a segurança alimentar global.