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Produtor de mel amigo do tatu-canastra? Conheça esta história!

Apicultores do Cerrado ganham certificação por ajudar a proteger o maior tatu do mundo da ameaça de extinção

tatu-canastra
Tatu Canastra. Foto: Mario Alves

O tatu-canastra (Priodontes maximus) é o maior tatu do mundo. A espécie, presente na América do Sul pode chegar a 1,5 metro de comprimento e pesar mais de 50 quilos – e mesmo assim é capaz de ficar em pé sobre as suas patas traseiras. Mas, infelizmente, estes animais fascientes estão na lista das espécies vulneráveis da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN), com declínio populacional de 30% e, quase três décadas.

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A ação do homem no Cerrado, habitat natural do tatu-canastra, está interferindo nas fontes de alimentação da espécie, baseada em cupins e formigas. Com isso, muitos tatus estão buscando alimento nas colmeias de abelhas dos produtores de mel da região.

apicultor tatu canastra
Marcas deixadas por tatu em caixa de apicultores no Mato grosso do SUl. Foto: ICAS

Como as caixas de mel estão próximas às áreas naturais, onde estão as flores para as abelhas, o tatu-canastra usa seu olfato apurado para encontrá-las e a sua capacidade de ficar em pé para acessá-las com certa facilidade. Os apicultores acabaram descobrindo que muitas vezes as caixas foram instaladas próximas às tocas dos tatus-canastra – uma espécie de hábito noturno. Isso não seria um problema se o ecossistema estivesse preservado, mas com a falta de alimentos, os tatus buscam novas fontes de comida.

tatu-canastra colmeia
Foto: Projeto Canastras e Colmeias

“Ao contrário do que muitos imaginavam, o tatu não consome o mel, mas sim as larvas das abelhas. De qualquer forma, ele derruba as caixas para comê-las, o que resulta em prejuízos para os apicultores”, revela Arnaud Desbiez, pesquisador e coordenador do Programa de Conservação do Tatu-canastra. Outros animais também são atraídos para o local em consequência da ação do canastra, como a irara (Eira barbara), o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), o tamanduá-mirim (Tamandua tetradactyla), o mutum-de-penacho (Crax fasciolata) e a seriema (Cariama cristata).

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Foto: ICAS

Para evitar que os animais sejam mortos para preservar as colmeias, Arnaud, a pesquisadora Bruna Oliveira e a jornalista Liana John escreveram o Guia de Convivência entre Apicultores e Tatus-Canastra no Cerrado do Mato Grosso do Sul, resultado de um trabalho realizado por profissionais que buscaram estratégias para conciliar a conservação dessa espécie ameaçada de extinção com a produtividade dos apicultores com soluções para um potencial conflito no Cerrado do Mato Grosso do Sul.

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Inofensivo ao homem e maduro sexualmente apenas aos sete anos de idade, o animal pode gerar apenas um filhote a cada três anos. Ou seja, a morte de um único indivíduo do tatu-canastra significa uma perda enorme para o ecossistema local.

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Foto: ICAS

De ameaça às melhores práticas

Com a colaboração de 10 associações apícolas, o projeto reuniu informações de 178 apicultores e identificou que 73% deles relataram danos às colmeias por tatu-canastra nos últimos cinco anos e que, em 2019, 46% dos entrevistados tiveram perdas econômicas substanciais com esses episódios.

tatu-canastra apicultores
Foto: ICAS

Como forma de conciliar a produtividade dos apicultores com a conservação da espécie, os pesquisadores elaboraram 10 estratégias para que os apicultores mantenham as caixas próximas à vegetação nativa, mas sem colocar a sua produtividade em risco. Entre as medidas estão: colocar as caixas a 1,30 m do chão, dessa forma elas ficam inacessíveis aos tatus; e usar cerca de alambrado com muro de concreto na base.

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apicultores mato grosso do sul
Medidas simples mantêm os tatuas afastados das caixas de abelhas. Foto: Divulgação | IPÊ

Na publicação, estão pontuadas as medidas mais eficazes para as espécies que também se aproveitam da ação do tatu-canastra. Os pesquisadores ainda incluíram medidas que não apresentam eficácia, com as devidas justificativas, como forma de evitar investimentos (de tempo e financeiros). O material traz todas as estratégias ilustradas pelo artista Ronald Rosa.

Certificação e valorização

Os apicultores que adotam as medidas de proteção ao tatu-canastra indicadas pelos pesquisadores ganham o direito de exibir em seus produtos a certificação de “Produtor amigo do tatu-canastra”, um reconhecimento ao compromisso de preservar a biodiversidade e a conservação desses animais. Até o momento, 33 apicultores já receberam o selo e dez estão em processo de certificação. Até o fim de 2023, a expectativa é de chegar a 200 produtores certificados.

tatu-canastra
Foto: Danilo Kluyber

“Com a certificação e as orientações do guia, incentivamos que os apicultores implementem melhores práticas, que sejam ambientalmente sustentáveis e que aumentam o valor agregado ao mel e aos produtos derivados que são produzidos. Dessa forma, a presença de tatus-canastra perto de colmeias se tornará mais um benefício do que um problema”, revela Arnaud.

selo amigo do tatu
Imagem: Reprodução | Canastras e Colmeias

Além do certificado e do trabalho de pesquisa e conscientização para a preservação da espécie, o Programa de Conservação do Tatu-canastra, realizado pelo Instituto de Conservação de Animais Silvestres (ICAS) e pelo Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), deu origem ao projeto “Canastras e Colmeias”, que conta com o apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.

“A certificação é uma oportunidade de compensar eventuais perdas de colmeias com abertura de novos mercados. O selo deve constar da embalagem de mel, dando visibilidade ao apicultor ‘amigo do tatu-canastra’. É um diferencial valioso e também uma sinalização importante para despertar a consciência ambiental e a preocupação ecológica do consumidor final ao optar por esse produto”, diz o pesquisador.

canastras e colmeias
Foto: Reprodução | Canastras e Colmeias

Para ele, associar a imagem dos apicultores à proteção ao tatu-canastra é uma maneira de contribuir com a ampliação do mercado de mel no Mato Grosso do Sul, no Brasil e no exterior, sobretudo para nichos de mercado de produtos ecologicamente corretos. Segundo a Global Consumer Insights Pulse Survey, pesquisa da PwC que investiga os hábitos de consumo, 50% das pessoas afirmam ter preocupação ecológica em suas decisões de compra.

“Propagar novas práticas e adequações para o apiário e gerar benefício aos apicultores é uma vitória. Dessa forma, mostramos que é possível gerar renda, empregos, negócios, oportunidades e desenvolvimento aliados à proteção da nossa biodiversidade”, afirma a gerente de Ciência e Conservação da Fundação Grupo Boticário, Marion Silva, ressaltando que cada vez mais consumidores fazem suas escolhas considerando atributos de sustentabilidade relacionados aos produtos e serviços.

Reconhecimento internacional

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Imagem: Reprodução

A ação recebeu a certificação Wildlife Friendly Network, inédita a uma iniciativa com sede no Brasil, que confirma o compromisso de um negócio com a sustentabilidade, a vida selvagem e os habitats. “Os selos indicam ao consumidor final que o mel é produzido sem prejudicar os animais que vivem na região. Além de se tornarem protetores do nosso gigante da biodiversidade, os apicultores irão agregar valor aos produtos tanto no mercado local quanto para exportação”, explica Desbiez.