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Quer construir uma casa sustentável? Arquiteta conta como é

Karen Miyabe Ueda desenvolve e aplica nos seus projetos práticas regenerativas que contribuem para construções cada vez mais sustentáveis

casa sustentável
Foto: Gera Arquitetura Brasil

Finalmente, depois de trabalhar muito tempo para uma empresa multinacional, Bia conseguiu economizar um dinheiro e comprar seu cantinho em meio a Mata Atlântica. O sonho de estar mais perto da natureza, de se conectar com seu eu interior, de ter o seu atelier e a oficina para seu parceiro seriam finalmente materializados em um projeto sustentável.

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Ela havia se preparado muito, com cursos e lido muitos livros. Agora ela já sabia das possibilidades de uma construção natural, utilizando tintas de terra e materiais orgânicos, já sabia que uma horta não era simplesmente uma linha de legumes e hortaliças, que poderia usar o sistema agroflorestal, enriquecer e reavivar o solo, era muito mais do que isso.

Nesse empreendimento, sonhava que a simplicidade trouxesse mais paz em seu coração, tenso com as pressões do trabalho e da correria da cidade. E assim, cheia de referências e ideias na cabeça e no seu arquivo pessoal do Pinterest começou sua jornada. E assim também é o começo da jornada de muitos que buscam por uma arquitetura natural e autêntica.

casa sustentável
Foto: Gera Brasil Arquitetura

Mas, sinto dizer, que não basta ter lido ou participado de vivências para conseguir levantar uma parede. Nem basta ter lido sobre Ernest Götsh, agricultor e pesquisador suíço que criou a Agricultura Sintrópica, para saber o peso que uma enxada tem e ver que o rendimento no final do dia foi somente 1 metro quadrado de área.

A Bia é uma pessoa fictícia, mas a experiência pela qual ela passou é a realidade de muitas pessoas que passam pelo meu escritório.

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Expectativa + Realidade

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Foto: Gera Brasil Arquitetura

Um sonho como esse, para se materializar, tem um percurso com tempos e prazos que são diferentes para cada um – a depender da disponibilidade e do valor a ser investido. Uma certeza é: no final, o resultado é tão gratificante quanto o nascimento de uma criança.

Quando o sonho nasce e sai do plano das ideias, queremos mostrar para o mundo, queremos expor nossas conquistas e como está sendo essa relação do eu e a natureza. E assim também, como os cuidados com um filho nunca tem um fim, a construção desse espaço, seja ela sua habitação ou para outros usuários, também demandam atenção e cuidados.

Arquitetura Sustentável

casa sustentável
Foto: Gera Brasil Arquitetura

A busca por uma arquitetura sustentável tem dois momentos: um momento é quando o indivíduo busca um espaço saudável, confortável e dentro de uma estética que traga alívio ou soluções para seu cotidiano. O outro é quando, além das questões pessoais, existem os propósitos para com o mundo e para com a sociedade.

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Neste caso, uma proposta de projeto deve reunir e combinar o uso de materiais naturais com o uso responsável dos recursos, para que no final tenhamos um resultado que nos traga prazer e que tenha harmonia. Este é o objetivo máximo e único de uma arquitetura sustentável.

A experiência de construir

O desejo e busca pessoal por uma vida mais consciente trouxe relevância aos materiais e técnicas construtivas dos nossos antepassados e ancestrais. A construção e a reforma deixaram de ser apenas uma necessidade e uma moda, mas uma forma de exaltarmos nossa cultura, nossas origens e nossa maneira de estar nesse mundo.

Construir dentro de um propósito que reduza impactos ao meio ambiente em equilíbrio com o entorno e que nos traga satisfação por fazer nosso papel é uma tarefa possível.

Assim, podemos trazer também o conceito da casa autônoma, ou seja, uma casa que gera sua própria energia, produz alimentos orgânicos, trata da sua água e cria um ambiente fresco, aconchegante e iluminado.  Uma casa onde podemos utilizar materiais reaproveitados, materiais de rápida renovação como o bambu, ou até mesmo terra ou madeira em estruturas e revestimentos, resultando em menor carga de emissão de CO2, entre outros benefícios.

casa sustentável
Foto: Gera Brasil Arquitetura

E ainda é possível pensar no formato da edificação, nas aberturas para entrada de ar e luz, na composição do entorno. Tudo tem um papel fundamental para fazer uma construção ser autossuficiente, assim como na natureza.

Dentro desta ideia, separei três de algumas soluções que podemos implementar para um projeto sustentável:

Sistemas

Em uma casa convencional, sempre há uma saída de esgoto, que é uma mistura de nutrientes e água. Do volume total, a água que sai dos chuveiros e das pias, chamadas de águas cinzas correspondem a 75% desse volume e 25% desta água é proveniente dos vasos sanitários, chamada de água preta.  O mesmo acontece no nosso corpo, já que expelimos por canais separados os líquidos e os sólidos. Pensando na casa como um organismo vivo, por que misturar os líquidos e os sólidos? Por que não os devolver à natureza de forma limpa no próprio espaço que você ocupa para viver?

A partir deste princípio, podemos construir sempre tendo em mente a devolução dessa água, tratada, para o meio, recarregando o lençol freático. Assim, biodigestores, wetlands e jardins de chuva são sistemas ideais para serem implantados em residências, principalmente em áreas rurais. Em alguns casos, podemos implantar em residências urbanas, mas são casos muito específicos.

Canteiro Bioséptico
Canteiro Bioséptico. Foto: Associação Caatinga | Divulgação

Materialidade

Muito mais do que saber se um material é sustentável ou não, a realidade tem a ver com a forma como utilizamos determinado material e como diminuímos a pegada de carbono desse material.

Existe uma ferramenta de gestão que se chama análise do ciclo de vida de um produto. Ela considera aspectos ambientais e impactos potenciais positivos e negativos ao longo da vida de um produto, desde a extração da matéria-prima até a destinação final. O mercado atualmente oferece diversos materiais sustentáveis, que podem ou não fazer parte de um projeto.

A questão aqui é avaliar o processo de fabricação, da extração da matéria prima até a produção do material e por fim adquirir o material e tê-lo instalado em casa.

casa sustentável
Foto: Gera Brasil Arquitetura

Podemos também avaliar o material pelos níveis de toxicidade emitidos no ambiente. As tintas imobiliárias são mais práticas e possuem um grande leque de cores. Mas, comparado com uma tinta mineral à base de terra, os níveis de toxicidade nos dão informações para a tomada de decisão final.

Obviamente as alternativas de uso de materiais devem ser analisadas de acordo com o contexto e a realidade de cada um, quando será mais ou menos sustentável dependendo das distâncias e dos locais onde serão utilizados.

A casa como ferramenta de transformação

As soluções são adotadas conforme o nível de exigência e tolerância de cada pessoa, de cada família, de cada casal. Dependem ainda do propósito de cada um. Uns querem ter um modo de vida mais simples, outros querem que do local sejam criados espaços de experiências mais intensas com a natureza, outros querem um espaço para práticas sensoriais e físicas.

Percebo por aí que uma pessoa que já possua hábitos alimentares mais saudáveis e mais naturais terá mais facilidade em se adaptar a esse tipo de arquitetura.

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Foto: Gera Arquitetura Brasil

Mãos (e cabeça) à obra!

Então, vamos parar de sonhar e começar a praticar tudo aquilo enche nossos corações de vontades. Vamos colocar mãos e cabeças para trabalhar.

Reforço aqui que a arquitetura sustentável é um complexo de sistemas, materiais, formas e métodos construtivos, cujo resultado é um lugar (único) onde o usuário poderá ter uma vida mais simples, com menos consumo, diminuindo o uso de produtos industrializados.

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Foto: Gera Brasil Arquitetura

Quanto mais elementos naturais a casa tiver, como pedra, madeira, terra, bambu, mas estará o usuário instigado a valorizar elementos simples, elementos artesanais. Quando pensamos em nosso propósito de vida temos que levar em conta a importância do lugar que habitamos. A paisagem, os aromas, os materiais, nossa casa formam o que somos.

Em 2015, iniciamos a construção de uma casa cujo projeto buscava o Selo Verde. Além dos requisitos materiais e de sistemas construtivos, o desafio desse projeto foi a gestão da execução. Com o desenho concluído e o início das obras, alguns sistemas foram sendo substituídos e a obra ia avançando com soluções que chamavam a atenção da comunidade.

Diante dessa reação, e como a equipe do escritório estava inspirada, o canteiro de obras virou um grande canteiro experimental, onde pudemos convidar em diversas etapas alunos, visitantes e empresas para que pudessem aprender e se inspirar. Para que pudessem ver que o trabalho que estava sendo feito poderia ser o começo de uma nova visão sobre como projetar, sobre como construir e sobre como ser sustentável. Veja o vídeo desta construção:

 

O trabalho e energia empregados para reunir tantas informações, conceitos e ideias e transformá-los em um espaço sólido e real é uma tarefa árdua, mas possível. E, ao final, o prazer daquele sentimento de autorrealização.

O resultado foi ver que a ação de uns e de outros poucas vezes passa no colocar a mão na massa e muito mais na idealização e construção de um sonho que acaba impactando o entorno: tanto das pessoas como do meio ambiente.

Construir de forma sustentável e ter um design de alta qualidade é possível. Um bom projeto respeita as particularidades e desejos de cada um. Agregar sistemas eficientes e usar a tecnologia a nosso favor e a favor do meio ambiente, atualmente, é indispensável.

Karen Ueda arquitetura sustentável
Karen Ueda. Foto: Arquivo pessoal

Este conteúdo foi produzido pela arquiteta Karen Miyabe Ueda, cofundadora do escritório Gera Brasil Arquitetura. Karen desenvolve e aplica nos projetos e empreendimento rurais, práticas regenerativas que contribuem para a tomada de decisões sustentáveis.

Em seus projetos tem como objetivo a pesquisa e a adoção de soluções de baixo impacto ambiental na construção e sempre está buscando uma sustentabilidade honesta e ao alcance de todos.

Formada em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Pós-graduada em Meio Ambiente e Sustentabilidade pela Fundação Getúlio Vargas e especialização em Design em Sustentabilidade e Design Ecológico pelo Gaia Education Brasil.