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Cacau e castanha-do-brasil
Castanha-do-brasil – Coopavam | Foto: Fred Rahal

As cadeias produtivas da floresta estão na base da bioeconomia amazônica, com potencial de atingir R$ 38,6 bilhões em 2050, segundo projeções recentes. Diante de entraves que dificultam investimentos e impedem avanços mais expressivos do setor, há soluções em curso empregadas por políticas públicas, empresas, academia e organizações da sociedade civil nas diferentes etapas, desde a extração dos produtos na natureza até o consumo final. Mapear iniciativas que dão certo, replicando boas práticas, torna-se peça-chave no cenário do combate ao desmatamento e da emergência climática. É o caso de um acervo de experiências e casos de sucesso que sai da caixa-preta e começa a ser desvendado para dois importantes insumos da Amazônia: a castanha-do-brasil e o cacau.

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“É necessário dar visibilidade a soluções para uma maior relevância da bioeconomia no Produto Interno Bruto (PIB), considerando duas cadeias estratégicas pelo impacto socioambiental, quantidade de atores envolvidos e boa resposta para inovações”, destaca Carlos Koury, diretor de inovação em bioeconomia do Idesam, em Manaus. O resultado está no estudo “Caminhos para o Fortalecimento de Cadeias Produtivas da Sociobiodiversidade Amazônica – Melhores Práticas nos elos das cadeias produtivas da castanha-do-brasil e do cacau”, recém-lançado pela instituição com um mapa inédito dos gargalos e de quem faz a diferença para resolvê-los.

Com financiamento do Partnerships for Forests (P4F), o levantamento traz cenários, dados, análises e informações de atores relevantes ao longo das duas cadeias produtivas. O objetivo é servir como um guia de inspiração e apontar caminhos para o desenvolvimento de novos negócios, políticas, pesquisas e afins.

Cacau e castanha-do-brasil
Coletores de Castanha da Coopavam. | Foto: Fred Rahal

Foram identificados casos que estão florescendo ou se consolidando de forma inovadora por meio de novos conceitos e práticas, como ajustes nos processos produtivos, arranjos e parcerias, modelos de financiamento, acesso a crédito e incorporação de tecnologias, entre outros resultados já prontos para compartilhar. É um acervo de referências de quem faz na prática e como – e abriu picadas na busca de melhores rotas para acelerar a bioeconomia.

“Já existem soluções validadas; devemos encurtar caminhos e não só martelar nos problemas”, diz Koury. Segundo ele, “o momento é favorável para um salto no setor, com a estratégia de valorizar a floresta em pé, indo além da fiscalização ambiental e outros esforços de comando-controle contra o desmatamento”.

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O estudo abrangeu cinco etapas das cadeias produtivas da castanha-do-brasil e cacau: extração – manejo, beneficiamento primário, transformação, comercialização e consumo. Em cada um dos elos foram identificados gargalos, possíveis frentes de solução e as referências de sucesso. Por exemplo, na etapa da extração – manejo, a assistência técnica é um imperativo e a parceria público-privada tem o poder de alavancar o tema, unindo políticas de governo à expertise das empresas em negócios, com sustentabilidade financeira.

castanha-do-brasil
Agroextrativistas da Coopavam. | Foto: Fred Rahal

No caso do consumo, ponta final da cadeia, a busca por selos de certificação, que atestam a produção orgânica ou conformidade com outros indicadores socioambientais, reforça a confiabilidade dos processos e comprovam o impacto positivo para a floresta e as pessoas. Há ainda o desafio da sensibilização: mostrar valores por trás dos produtos e a ligação deles com a conservação da floresta e modos de vida tradicionais.

Cenário da castanha-do-brasil

A cadeia da castanha-do-brasil promove ocupação e renda para mais de 60 mil famílias de povos e comunidades tradicionais, mais de 100 organizações comunitárias e cerca de 60 empresas beneficiadoras e comercializadoras na Amazônia e em outras regiões do Brasil.

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O insumo tem forte ligação e relevância em termos de preservação ambiental, com presença de castanheiras nas áreas mais preservadas da região, e sendo uma atividade compatível com a floresta em pé. O Brasil é o maior produtor mundial, mas perde nas exportações para a Bolívia, que consegue se adequar às normas sanitárias da Europa e Estados Unidos.

O produto nacional se destina principalmente ao mercado interno de alimentação, mas novas aplicações de maior valor agregado – para cosméticos, super foods e bioplásticos, por exemplo – estão surgindo por meio de pesquisas científicas e inovações de startups.

Case de referência | Mahta

“Para produzir super foods agregamos valor a um resíduo altamente nutritivo, hoje jogado fora no beneficiamento da castanha. O desafio é achar fornecedor que faça o processamento desse subproduto na Amazônia, para gerar renda na região. Hoje a produção ocorre em São Paulo. E para conseguir a matéria-prima na escala viável, a solução tem sido parcerias de compra junto com outras empresas. Por meio de certificações, além de garantir qualidade e abrir portas no mercado, avançamos na gestão dos processos internos, na relação com fornecedores e na sensibilização do consumidor quanto aos benefícios pela origem amazônica”, diz Fabio Muller, head de Operações e Supply da Mahta.

castanha-do-brasil
Agroextrativistas de Castanha da cooperativa Abufari. | Foto: Divulgação | Abufari

Apoiada pela aceleradora Amaz, a empresa atua no ramo da nutrição por meio de super foods com bioativos da floresta. O alimento em pó, normalmente tomado na forma de shakes, segue o conceito plant based; é 100% natural, possui alto valor proteico e baixo teor de carboidrato. Com venda ao consumidor por e-commerce e market place, a empresa comprou 10 toneladas de castanha de diversos fornecedores do Pará e Mato Grosso, em 2023 – mais que o dobro de crescimento em relação ao ano anterior. Em 2024, o plano é entrar no mercado americano.

Case de referência | Cooperativa de Produção do Povo Indígena Paiter Suruí (Coopaiter)

“Não temos o perfil de disputar preços pela quantidade, mas sim pela qualidade, à altura de um povo indígena que utiliza o produto na alimentação e geração de renda. A expectativa é de sensibilização do consumidor devido ao poder de ajudar a conservação da Amazônia pelo consumo. Quem valoriza a castanha, valoriza a manutenção da floresta como um todo, até porque a movimentação dos indígenas para coleta dos frutos é chave ao monitoramento do território. Só alcançaremos essa valorização para viabilizar o processo produtivo, quando atingirmos a produção de 2 mil Kg/mês a R$ 70/Kg. Estamos no caminho. Fizemos embalagem de alto padrão com simbologias do povo indígena e iniciamos parcerias para o mercado de consumo consciente”, Elisângela Suruí, gerente de produção da Coopaiter.

A Coopaiter abrange a produção de 2400 famílias da Terra Indígena Sete de Setembro, em Rondônia, com destaque para o café e a castanha-do-brasil. Após apoio do governo estadual para aquisição de equipamentos e parceria com empresa paranaense para o know-how de beneficiamento, a cooperativa recebeu apoio da Conexsus para viabilizar o início da produção com a venda da castanha a valores cinco vezes superiores que os de mercado, no cenário de dificuldades da pandemia de Covid19. Além de vendas institucionais para brindes, a cooperativa tem acesso a políticas de compras públicas: na safra de 2023, os indígenas receberam renda de R$ 1,6 milhão por meio do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do governo federal.

Cenário do cacau

A cadeia do cacau, fruto nativo da Amazônia, tem peso econômico relevante e demanda crescente – inclusive em nichos premium que se relacionam fortemente com melhores indicadores socioambientais e agregação de valor em comunidades.

No Brasil, existem cerca de 600 mil hectares cultivados e 75 mil produtores, 60% da agricultura familiar. Em 2022, a produção nacional atingiu 200 mil toneladas de amêndoas/ano, com US$ 340 milhões de exportações de chocolates e derivados de cacau. O Pará é o maior produtor nacional.

Cacau agroflorestal
A rentabilidade do cacau agroflorestal chega a ser de sete a dez vezes maior do que a pecuária.

Além da cadeia de commodity, que representa 95% do mercado global, o cacau é comercializado em mercados especiais, como chocolates finos de alta qualidade e manteiga para indústria cosmética. Esses segmentos são bastante propícios à produção amazônica pelos atributos associados à produção em agrofloresta com benefícios às pessoas, ao clima e à biodiversidade.

Caso de referência | Warabu

“Apostamos no conceito da alta qualidade e da origem amazônica das matérias-primas por meio de uma relação justa e direta junto a pequenos produtores, com capacitação e certificação. Além do selo vegano e orgânico, estratégicos ao reconhecimento internacional, investimos em maquinário italiano de alto padrão tecnológico para chocolates especiais. Em 2024, vamos aumentar a capacidade de nossos fornecedores, com garantia de compra, pagando o dobro do preço de mercado”, Jorge Neves, fundador da Warabu.

Reconhecida por prêmios como o Bio Brazil Fair, em 2023, a empresa produz chocolates premium em 12 versões de sabores, vendidos em lojas e market places. A expectativa é iniciar exportações em 2024. Após o aporte inicial de R$ 3 milhões viabilizado por investidores, foram obtidos mais R$ 900 mil da Finep para custear a tecnologia que aumentou entre 30% e 40% a qualidade do produto. Novos investimentos estão previstos para verticalizar o processo de fabricação, com aproveitamento de subprodutos do cacau.

Confira o estudo completo aqui.