Fogo no Pantanal teve origem humana, aponta investigação

Polícia Federal investiga focos de incêndio na região: 85% das queimadas ilegais acontecem em propriedades privadas

fogo no Pantanal
Foto: Jédson Alves | Agência Brasil

Mais uma vez, os incêndios no Pantanal voltam a ameaçar o bioma. Em 2024, 661 mil hectares foram consumidos por incêndios. O fogo ganha força graças às condições climáticas, com uma das piores secas já registradas. Uma área que normalmente seria alagada acumulou matéria orgânica e com o calor e a seca, qualquer chama se propaga com extrema facilidade. Mas, apesar das condições ideais para que o fogo se espalhe, a causa do fogo precisa ser esclarecida.

O diretor executivo do SOS Pantanal, Leonardo Gomes, afirma que o fator humano deve ser considerado. Conforme nota técnica de Avaliação da Situação do Fogo no Pantanal do LASA, divulgada no último dia 24, não foram registradas descargas elétricas provenientes de raios no Pantanal nos meses de maio e junho nos locais onde os focos começaram, o que aponta para a ação humana como origem das chamas.

O boletim “Combate aos incêndios florestais no Pantanal” traz atualizações semanais sobre a situação dos incêndios no Pantanal e reforça a probabilidade de que os focos registrados nos meses de maio e junho podem ter sido induzidos, especialmente em propriedades privadas – um total de 3.451 focos identificados nesse período.

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Foto: Chico Ribeiro | Brasil de Fato

“Nossa preocupação inicial foi alertar o poder público e a sociedade civil para essa situação de extrema seca que se aproximava, um diagnóstico que vem se confirmando nas últimas semanas. Felizmente, temos visto uma forte movimentação nas últimas semanas, com empenho crescente de pessoal, equipamentos e aeronaves, inclusive de outros Estados, que estão chegando ao Pantanal. Isso aumenta a chance de sucesso no controle desses incêndios”, avalia Leonardo Gomes.

Apesar dos números alarmantes de focos e da área queimada muito acima da média histórica para este período, o fogo está localizado principalmente na porção sudoeste do Pantanal, especialmente na região de Corumbá. A maior parte dos focos de incêndio iniciou-se próximos à beira dos rios Paraguai e Paraguai Mirim, áreas sabidamente povoadas e de fácil acesso através de embarcações.

Investigação e ação federal

A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, esteve na região no dia 1º de julho de 2024 e confirmou que a Polícia Federal está investigando a origem de pelo menos 18 focos de incêndio no Pantanal. A suspeita é de que os focos sejam decorrentes do descontrole de queimadas praticadas ilegalmente, a maior parte (85%) em áreas privadas.

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Foto: Heideger Nascimento

Imagens de satélite do BDQueimadas, do INPE, e do Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LASA/UFRJ) confirmam que apenas em janeiro, fevereiro e abril houve algum incêndio que começou em razão de causas naturais.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, reforçou os levantamentos do INPE e do LASA/UFRJ. “Nesse momento, não temos incêndios em função de ignição natural. Os climatologistas dizem que o período não propicia essa forma de incêndio. Todos eles são por ação humana, seja por desmatamento, seja por queimada”.

Em nota enviada à imprensa o SOS Pantanal defende que é urgente e de extrema importância a realização de investigação, fiscalização e perícia para identificar e responsabilizar os causadores destes focos que foram responsáveis por enormes áreas queimadas. “A ação de poucas pessoas tem o poder de destruir áreas muito grandes, como visto nas regiões próximas ao Rio Paraguai em Corumbá, especialmente, um dano pelo qual todos nós pagamos”, explica Gomes.

Marina afirmou que a Polícia Federal está investigando os incêndios no Pantanal e garantiu que eventuais culpados serão responsabilizados na Justiça. “Nós já sabemos de onde veio a propagação desse fogo. As pessoas serão identificadas, mas a investigação está em curso. Foram 18 focos de incêndio em lugares diferentes que deram início à propagação desse fogo”, disse.

Marina ainda destacou que os municípios do Pantanal que mais registram desmatamento são aqueles onde há mais focos de incêndio. “Corumbá está respondendo por metade dos incêndios do Mato Grosso do Sul, e lá o desmatamento aumentou 52%. Correlação direta.”

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Tuiuiú em queimada. Imagem: Lawrence Wahba

É importante ressaltar que a prática de queimadas controladas para manejo, para pasto ou para qualquer cultivo, está proibida e será criminalizada pelo menos até o fim do ano, tanto no Pantanal como em áreas da Amazônia e do Cerrado. No Pantanal, a proibição vale até 31 de dezembro.

Legislação ambiental e responsabilidades

“Precisamos realizar um trabalho forte de educação ambiental e conscientização, pois a tendência é de que esses incêndios criminosos continuem nos próximos meses e anos caso não sejam responsabilizados seus autores”, avisa Leonardo Gomes.

“A gente precisa chamar o Congresso Nacional para sentar nessa mesa, apontar a responsabilidade pelo pacote de medidas antiambientais, conversar sobre o orçamento, dizer ‘vocês estão falhando, atuando ativamente para piorar o problema’”, observou Nauê Bernardo, do Observatório do Clima.

Alexandre Bossi, presidente da do SOS Pantanal, confirma que a situação é alarmante, mas diz que é importante lembrar que “não é o Pantanal inteiro que está pegando fogo. O incêndio é localizado, e é importante transparecer isso para o público. Informações erradas podem afetar inclusive um dos principais setores geradores de renda do bioma, como o turismo. Os incêndios começaram em sua grande maioria nas margens do Rio Paraguai, por isso é crucial o reforço de trabalhos de conscientização nessas áreas mais povoadas, com populações ribeirinhas e moradores do município”, afirma

Danos irreversíveis

combate ao fogo no Pantanal
Depois que o fogo é apagado, os danos seguem por muito tempo. Foto: SOS Pantanal

O ciclo recente de temporadas chuvosas abaixo do normal e incêndios mais frequentes e intensos empurram o Pantanal para o colapso ecossistêmico em algumas áreas do bioma. O alerta é do presidente do IBAMA, Rodrigo Agostinho, que prevê também que a seca atual persista até o final do ano.

“A natureza volta em muitas áreas depois de desastres como esse. Mas, em algumas áreas a perda é significativa. Em alguns lugares pode ser, inclusive, irreversível. A gente está muito assustado em ver, pelo sexto ano seguido, o Pantanal sem o período de cheias”, afirmou Agostinho em entrevista ao g1. “A gente trabalha com o pior cenário, que é o cenário de uma seca até o final do ano”, alertou o chefe do IBAMA.

Quer ajudar a combater o fogo no Pantanal?

As Brigadas Pantaneiras do SOS Pantanal e a Brigada Alto Pantanal contam com doações para manter a ampliar a sua atuação. É possível contribuir com doações no site www.sospantanal.org.br/apoie/#doacoes ou pelo PIX [email protected].

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O Pantanal é um paraíso de biodiversidade. Na foto,. região da Serra do Amolar. Foto: SOS Pantanal