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Ailton Krenak é o 1º indígena eleito imortal da Academia Brasileira de Letras

Uma voz incansável na defesa dos direitos dos povos originários, da vida na Terra, e de um novo modelo de desenvolvimento

Ailton Krenak
Foto: Garapa – Coletivo Multimídia / Wikimedia Commons.

Autor de títulos como “O amanhã não está à venda”, “Ideias para adiar o fim do mundo” e “A vida não é útil”, Ailton Krenak é uma voz incansável na defesa dos direitos dos povos originários, da vida na Terra, e de um novo modelo de desenvolvimento que coloque as pessoas e o meio ambiente no centro do debate e das preocupações. Ele é o primeiro indígena a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL).

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Com 23 votos, o escritor indígena foi eleito na última quinta-feira (5) para ocupar a cadeira de número 5, que pertenceu a José Murilo de Carvalho, falecido em agosto deste ano. Disputaram com Krenak a historiadora Mary del Priore e o escritor também indígena Daniel Munduruku, que obtiveram, respectivamente, 12 e quatro votos.

Sua eleição coincide com o aniversário de 35 anos da Constituição Cidadã, promulgada em 5 de outubro de 1988. Durante a Assembleia Nacional Constituinte, Krenak desempenhou um papel significativo em defesa do Capítulo dos Índios (arts. 231 e 232), ficando marcado por seu célebre discurso proferido no Congresso Nacional em 04 de setembro de 1987. Nos anos que antecederam a promulgação da Constituição, Krenak participou também da organização e articulação do Movimento Indígena.

Repercussão

Para o presidente da ABL, Merval Pereira, Krenak é um poeta com “visão de mundo muito própria e apropriada para este momento, em que o mundo está preocupado com o meio ambiente, em que os povos originários lutam por seus direitos. Tudo isso está embutido na vitória de Krenak na Academia. É um indígena que trabalha com a cultura indígena, com a valorização da oralidade”.

Ailton Krenak eleito ABL
Foto: ABL

Merval Pereira citou o livro Futuro Ancestral, de Krenak, que trata da preservação dos rios como forma de conservar o futuro. “Os rios já estavam aqui antes de a gente chegar. Esta visão da natureza, do homem junto com a natureza, é que a gente está reforçando com esse grande escritor e intelectual indígena”.

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A acadêmica Rosiska Darcy classificou a eleição de Krenak como histórica. “Não só para Academia, como para o Brasil, não há melhor substituto para um grande historiador do que a história encarnada, que é o Krenak. Ele encarna hoje uma parte importante da história do Brasil. Estou muito feliz com a eleição dele”, manifestou a escritora.

Ailton Krenak falou à ABL dos seus primeiros planos enquanto imortal. “Uma das minhas intenções é convidar a ABL para criar uma plataforma, com a experiência que temos, por exemplo, com uma plataforma que já existe, chamada Biblioteca Ailton Krenak, disponível para quem quiser acessar na web centenas de imagens, textos, filmes e documentos. Não é legal? Poderíamos fazer isso com todas as línguas nativas. Teria tudo a ver com a Academia Brasileira de Letras incluir mais umas 170 línguas além do português. Se olhamos os acervos que já existem, o Museu do Índio tem um acervo muito antigo de registros de narrativas, algumas delas só na língua materna. Vamos traduzi-las com uma tradução simultânea e as pessoas vão poder ouvir. Podemos fazer isso junto com todas as etnias que estão envolvidas no resgate linguístico. A Unesco declarou essa década a segunda década das línguas indígenas. Podemos chamá-la para dar um pouco mais de publicidade junto com a ABL. A ideia é priorizar a oralidade, e não o texto. O que ameaça essas línguas é a ausência de falantes”, detalhou.

Breve histórico

Ailton Krenak nasceu em 1953, na região do vale do rio Doce (MG), território do povo Krenak, um local afetado pela atividade de extração de minérios. Krenak é ativista do movimento socioambiental e de defesa dos direitos indígenas. É comendador da Ordem de Mérito Cultural da Presidência da República e doutor honoris causa pela Universidade Federal de Minas Gerais e pela Universidade Federal de Juiz de Fora.

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Krenak organizou a Aliança dos Povos da Floresta, que reúne comunidades ribeirinhas e indígenas na Amazônia e contribuiu para a criação da União das Nações Indígenas (UNI). É coautor da proposta da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) que criou a Reserva da Biosfera da Serra do Espinhaço, em 2005, e é membro de seu comitê gestor.

Ailton Krenak
Imagem: Vozes da Floresta

Nas décadas de 1970 e 1980, foi determinante para a conquista do “Capítulo dos índios”, o capítulo 8º na Constituição de 1988, que passou a garantir, no papel, os direitos indígenas à cultura e à terra. Entre os livros mais recentes, estão Ideias para adiar o fim do mundo (2019), A vida não é útil (2020), Futuro ancestral (2022) e Lugares de Origem (2021), escrito junto com Yussef Campos.

Em A vida não é útil, ele aborda a pandemia da covid-19 e diz: “Se durante um tempo éramos nós, os povos indígenas, que estávamos ameaçados da ruptura ou da extinção do sentido da nossa vida, hoje estamos todos diante da iminência de a Terra não suportar a nossa demanda”. Krenak valoriza a cultura indígena e mostra que a forma de lidar com a natureza e o mundo têm muito a ensinar a sociedades capitalistas.

Ailton Krenak eleito ABL
Foto: ABL

“Já vi pessoas ridicularizando: ele conversa com árvore, abraça árvore, conversa com o rio, contempla a montanha, como se isso fosse uma espécie de alienação. Essa é a minha experiência de vida. Se é alienação, sou alienado. Há muito tempo não programo atividades para depois. Temos de parar de ser convencidos. Não sabemos se estaremos vivos amanhã. Temos de parar de vender o amanhã”, diz em outro trecho do mesmo livro.

Com informações de Agência Brasil e Funai