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Desmatamento em terras indígenas na Amazônia gerou 96 milhões toneladas de CO2

Do total, 59% foram emitidos entre 2019 e 2021, com desmate 195% maior

garimpo roraima
Garimpo ilegal de ouro em Mato Grosso. | Foto: SEMA – MT

Mesmo os indígenas sendo um dos povos que mais protegem a vegetação nativa, suas terras são as mais ameaçadas da Amazônia. A população vulnerável, e muitas vezes isolada, é alvo de interesses diversos, tais como, garimpo, madeira, agropecuária. A ofensiva em territórios indígenas causa a destruição da floresta e a consequente liberação de gases associados ao efeito estufa. Analisando o desmatamento em terras indígenas na Amazônia entre 2013 e 2021, pesquisadores brasileiros concluíram que 96 milhões de toneladas de gás carbônico foram liberados na atmosfera.

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O desmatamento nas TIs (terras indígenas) atingiu uma área de 1.708 quilômetros quadrados, o que equivale a 2,38% de todo o desmate na Amazônia brasileira no período. Em 232 TIs analisadas, a taxa de devastação foi, em média, de 35 km2 ao ano, representando aumento de 129% entre 2013 e 2021.

O estudo, publicado na revista científica Scientific Reports, do grupo Nature, aponta ainda que 59% das emissões (ou 57 milhões de toneladas de CO2) foram geradas nos últimos três anos analisados (2019-2021), resultando em uma alta de 195%. O período coincide com a intensificação da devastação.

“Os três primeiros anos de Bolsonaro também registraram avanço de 30%, a partir das bordas, para dentro das terras indígenas na floresta, chegando a áreas antes conservadas”, salienta o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), em nota. Esse dado preocupante traduz a despreocupação com que criminosos avançam na derrubada da floresta.

“Com o enfraquecimento das instituições ambientais e tentativas inconstitucionais de exploração econômica desses territórios, o desmatamento aumentou significativamente. Junto com essa atividade vem a emissão de gás carbônico, que compromete as metas de redução assumidas pelo Brasil em acordos climáticos”, pontua Celso Henrique Leite Silva-Junior, pesquisador associado no IPAM e no pós-doutorado da UCLA (Universidade da Califórnia Los Angeles), que liderou o estudo.

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O IPAM integra a equipe que trabalhou no relatório, composto por cientistas de dez instituições e universidades localizadas no Brasil, nos Estados Unidos, na Holanda e no Reino Unido.

Dados

Foram 232 terras indígenas analisadas no estudo, sendo que 42% apresentaram aumento significativo do desmatamento. A mais afetada no período analisado foi a terra indígena Apyterewa, no Pará.

Segundo o IPAM, a mineração ilegal é o principal motor para a maior intensidade no desmatamento a partir de 2019. Dentro das terras, a proporção de alertas de desmatamento classificados, posteriormente, como áreas de mineração, subiu de 1% em 2016 para 14% em 2021; ainda, 19% no primeiro semestre de 2022. Aliás, nesta semana foi suspensa a “presunção da boa-fé” no comércio de ouro – uma medida apontada como determinante para o avanço do garimpo ilegal nos últimos anos.

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O pesquisador Silva-Junior salienta que o impacto é muito maior do que os números podem mostrar: além da perda de floresta, o “desmatamento serve de vetor de outros problemas para o interior dessas áreas, como o avanço de doenças e ameaças à sobrevivência de indígenas isolados. Um caso recente é o do povo Yanomami, onde houve diversas mortes de indígenas após a entrada de garimpeiros”, exemplifica.

balsas garimpo ilegal
Balsas de garimpo. Foto: © Bruno Kelly | Greenpeace

Um dado positivo é que 11% das áreas analisadas reduziram o desmatamento. Entre elas está a TI Alto Turiaçu, no Maranhão, onde vivem cerca de 1.500 indígenas dos povos Awa Guajá, Ka’apor e Tembé. Silva-Junior, que é também professor do Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade e Conservação da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), afirma que no caso do Maranhão os indígenas conseguiram tal feito porque têm iniciativas próprias de combate ao desmatamento ilegal, sendo grupos que atuam como guardiões da floresta.

Gás carbônico

A quantidade de gás carbônico liberada na atmosfera só pelo desmatamento em terras indígenas amazônicas no período é 1,8 vezes maior que a média anual de emissões brasileiras por processos industriais, entre 1970 e 2021, conforme dados do SEEG (Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases do Efeito Estufa). É mais que a soma das emissões anuais dos estados Roraima e Amapá.

O gás carbônico é um dos gases do efeito estufa que, liberado em excesso por atividades humanas, causa o aumento da temperatura média do planeta e, assim, o superaquecimento da Terra. As alterações provocadas por essa mudança no clima acarretam, por exemplo, a maior ocorrência de eventos climáticos extremos.

Como reverter o desmatamento em terras indígenas

Ao final do artigo, os pesquisadores listaram seis recomendações que podem ser aplicadas como políticas públicas contra o avanço do desmatamento em terras indígenas, confira:

  • Fortalecer a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas), com mais recursos e aumento de pessoal, garantindo o envolvimento de povos indígenas nos processos de tomada de decisão;
  • Revogar legislações que representam retrocessos ambientais;
  • Apoiar projetos de restauração dos ecossistemas e iniciativas de agricultura sustentável, incluindo projetos de restauração de ecossistemas;
  • Investir em monitoramento por sensoriamento remoto, inclusive no desenvolvimento de novos sistemas com melhorias em frequência e escala;
  • Criar uma faixa de segurança de 10 km ao redor de terras indígenas, como área de proteção dos impactos de atividades exploradoras, como a mineração ou projetos de infraestrutura;
  • Cancelar registros irregulares de CAR (Cadastro Ambiental Rural) dentro das terras indígenas.

O artigo Brazilian Amazon indigenous territories under deforestation pressure pode ser lido aqui (em inglês).

Com informações do IPAM e Agência FAPESP