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Cacique é premiada por aliar produção e conservação na Amazônia

Katia Silene Tonkyre, a primeira mulher cacique da aldeia Akratikatejé, lidera e empreende mantendo a floresta em pé

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“Tudo o que fazemos é caminhar para um futuro melhor, saudável e com uma boa vida”. | Foto: IICA

A cacique da aldeia Akratikatejé, localizada no estado do Pará, na Região Norte do Brasil, receberá o prêmio “A Alma da Ruralidade” do IICA (Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura). A premiação reconhece suas iniciativas de organização e empenho para empreender, coletar e produzir e, ao mesmo tempo, educar e conscientizar sobre a importância da conservação e da proteção do meio ambiente na maior floresta tropical do mundo, a Amazônia.

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“Trata-se de um reconhecimento aos que cumprem um duplo papel insubstituível: ser avalistas da segurança alimentar e nutricional e, ao mesmo tempo, guardiões da biodiversidade do planeta pela produção em qualquer circunstância. O reconhecimento também tem a função de destacar a capacidade de promover exemplos positivos para as zonas rurais”, diz o Diretor Geral do IICA, Manuel Otero. Ele enfatiza a importância de destacar lideranças na região amazônica, nesse caso, do Brasil, e de pessoas que pertencem a comunidades vulneráveis.

No âmbito do programa Líderes da Ruralidade, o IICA trabalha para que o reconhecimento facilite a criação de vínculos com organismos oficiais, da sociedade civil e do setor privado para obter apoio para suas causas.

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A aldeia Akratikatejé localizada no estado do Pará. | Foto: IICA

“São pessoas cuja marca está presente em cada alimento que consumimos — aonde quer que cheguem —, em cada lote de terra produtiva e nas comunidades que habitam. São homens e mulheres que deixam um rastro e que são a alma da ruralidade, pois produzem, plantam, colhem, criam, inovam, ensinam, protegem e unem”, acrescenta Otero. “São pessoas que encarnam lideranças positivas e silenciosas, às quais é preciso dar visibilidade e reconhecimento. São, sobretudo, exemplos de vida. Pois transformam, superam adversidades e inspiram”, completa.

Katia Silene Tonkyre, a mulher cacique

As imagens de satélites do Google Maps mostram a reserva indígena Mãe Maria como um impenetrável e profundo manto verde. Essa floresta tropical nativa e intacta é custodiada e venerada diariamente por Katia Silene Tonkyre, a primeira mulher cacique da aldeia Akratikatejé, situada no estado amazônico do Pará, na região norte do Brasil.

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Cerca de 3.500 indígenas vivem na reserva de quase 63.000 hectares, a qual, além de seus limites homologados pelo Estado Federal brasileiro em 1986, está rodeada de campos que as mesmas imagens mostram desmatados.

Katia Silene, de 54 anos, lidera uma das 27 aldeias que a reserva abriga, na qual vivem 85 indígenas de 23 famílias da etnia Gavião da Montanha, dedicadas principalmente à coleta, produção e venda de castanhas e de pescado, mel e frutas.

Um aglomerado de casas de madeira e um lago dão vida à comunidade, que também possui um posto de saúde e um enorme pátio coberto de palha sustentado por colunas de madeira que, entre outros usos, serve para dar aulas às crianças e jovens da aldeia.

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A cacique, designada pelo IICA como Líder da Ruralidade das Américas, é filha do respeitado cacique Payaré, um lutador pelos direitos dos indígenas já falecido que implantou na aldeia o conceito de empreendedorismo e de produzir sem agredir a natureza, beneficiando a comunidade com a organização, a coleta e a produção de castanhas, maracujá, açaí, cacau, cupuaçu e outras frutas amazônicas, além de mel, animais e criação de peixes, o que gera empregos e receitas.

Katia continuou e aperfeiçoou esse legado, ampliando-o para a realização de parcerias e de ações que contribuíram para o bem-estar de sua comunidade.

Katia Silene Tonkyre,
Foto: IICA

“Eu não concordo quando alguém diz que é necessário destruir a floresta para criar gado ou investir em soja. Nós queremos alcançar um projeto sustentável e queremos crescer, mas não destruindo a natureza. Nós valorizamos os nossos produtos. É possível conciliar as duas coisas, fazer o projeto e manter a floresta em pé, utilizá-la. A floresta nos dá uma farmácia verde e rica, temos os nossos animais e temos a nossa floresta”, afirma Katia.

“A natureza, a floresta, somos nós. Nós somos a Amazônia, nós somos a floresta. Quando uma árvore morre, morre uma parte de nós, pois somos as raízes dessa floresta. E a castanha é o nosso ouro; também temos açaí, cacau e peixes, e agregamos valor à nossa produção sem agredir a natureza”, relata a cacique.

Durante a sua infância, na década de 1970, Katia sofreu a expulsão de seu povo da vizinha Tucuruí, na qual foi construída uma represa, e um reassentamento complicado no município de Bom Jesus do Tocantins, a cerca de 10 quilômetros da cidade de Marabá, no sudoeste do Pará. Ali desenvolveram a coleta da chamada castanha do Pará.

Renda que vem dos frutos da terra

Seis anos atrás, montaram uma fábrica e uma cooperativa para processá-la e comercializá-la, e a cacique está buscando auxílio público e do setor privado para melhorar o abastecimento de energia elétrica (de monofásica para trifásica) para a aldeia, para que seja possível operar máquinas que permitam consolidar uma produção de 20 toneladas por colheita, assegurando receitas para toda a aldeia.

A aldeia também trabalha com copaíba, cujo fruto é rico em ácido oleico-linoléico e em vitamina E, sendo usado na fabricação de sabões, bálsamos ou óleos essenciais e dispõe de propriedades hidratantes, anti-inflamatórias, analgésicas e antibacterianas que lhe conferem inúmeros benefícios.

Katia Silene Tonkyre também busca assistência técnica que permita que ela, sua família e sua comunidade aumentem a produção da aldeia de milho, mandioca e frango, além de melhorar a comercialização de pescado e desenvolver a construção de cabanas e trilhas, de modo a atrair turistas à reserva.

“O nosso caminho é produzir de forma sustentável. E cumprir o sonho de meu pai, o cacique Payaré, de um povo Akratikatejé autônomo, com a floresta de pé”, acrescenta.

Katia Silene Tonkyre
Foto: IICA

Entre as dificuldades enfrentadas atualmenta, ela lamenta não ter uma estrutura de armazenamento e câmara frigorífica para poder vender mais, por exemplo, cupuaçu.

“A colheita do açaí está terminando e agora vem a de castanha e de cupuaçu, e é muito cupuaçu — que lamentavelmente perderemos uma parte porque não temos freezer nem câmara frigorífica para abastecer os produtores de polpa”, conta.

Saboroso, o cupuaçu possui alto teor de fósforo e pectina que é usada para fazer sucos, bolos e néctares e cuja semente, que contém altos percentuais de proteína e gordura, é usada para preparar um produto com características semelhantes ao chocolate e cosméticos.

Outro sonho na lista de projetos da líder indígena está o de retomar a exportação de castanhas, iniciativa que também precisa de assistência técnica para a construção de um pequeno armazém, além de equipar uma pequena fábrica.

Enquanto corre atrás de seus objetivos, um dos grandes orgulhos da cacique é o pertencimento dos mais jovens à aldeia.

“Somos fortes. Na região, não há indígenas vivendo na rua, nem querendo sair da aldeia, pois a nossa terra é rica. Temos frutas, área para plantar e trabalhar com a agricultura. Temos mel em quantidade e copaíba. Somos um povo abençoado, muito rico, e a nossa riqueza é a floresta de pé. Não há necessidade de nenhum índio ir embora. Temos uma matéria sustentável e muita riqueza em nossa floresta”, entusiasma-se.

“Tudo o que fazemos é caminhar para um futuro melhor, saudável e com uma boa vida. Queremos que os jovens valorizem o território e a nossa floresta, que não precisamos derrubar, tirar madeira ou ouro, pois temos outras riquezas. Eu aprendi com o meu pai a cuidar do futuro, a me preocupar com o amanhã. Quebrei um protocolo, porque as mulheres não podiam ser caciques, devido a modelos ultrapassados. Nós, mulheres, estamos conquistando cada vez mais espaços, e devemos continuar fazendo a diferença para que as coisas funcionem”, conclui.

As informações sāo do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura