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Vegetação nativa em propriedades privadas gera R$ 6 trilhões ao ano

Há um projeto de lei em voga que propõe que reservas legais não sejam mais obrigatórias – cientistas contestam.

Por que o Brasil precisa de suas reservas legais? Esta deveria ser uma questão óbvia, mas virou caso de estudo. E não se trata apenas de benefícios ambientais: a extinção da vegetação nativa existente em Reservas Legais de propriedades privadas no Brasil geraria um prejuízo de R$ 6 trilhões por ano.

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O número surpreendente é o valor dos  serviços ambientais que tais áreas prestam. Isso inclui, entre outras coisas, controle de erosão, produção de chuvas, regulação climática, polinização e controle biológico.

Os pesquisadores usaram estimativas da literatura científica para fazer o cálculo. “Um hectare de floresta tropical pode gerar benefício estimado de US$ 5,382/hectare/ano pela prestação de 17 diferentes tipos de serviços ecossistêmicos”, afirma o estudo.

A estimativa foi formulada por cientistas brasileiros, que tiveram o endosso de 400 outros pesquisadores, de 79 instituições acadêmicas. O estudo foi publicado na revista Perspectives in Ecology and Conservation.

Para os cientistas, as Reservas Legais devem ser consideradas como ativos para o desenvolvimento do Brasil e não passivos. Além das potenciais oportunidades econômicas e de saúde, a pesquisa enfatiza a importância dessas reservas para valores mobiliários de água, energia, alimentos e clima – sem esquecer é claro da manutenção da biodiversidade. O estudo também ressaltar efeitos em termos de participação no mercado internacional.

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Apesar da gama de serviços ecossistêmicos tanto para proprietários de terras como para toda a sociedade, há um discurso antigo (porém mais em voga do que nunca) de que a proteção ambiental é empecilho para o desenvolvimento do país. Parte do setor de agronegócio e seus respectivos representantes políticos, afirmam que a exigência de Reserva Legal é “restritiva e impede a plena expansão das atividades agrícolas”. 

O estudo mostra que os argumentos contrários às reservas – seja no sentido de extingui-las ou enfraquecê-las – não são baseadas em dados ou evidências ou teoria e, pior, “são baseados em raciocínio ilógico”.  

Falácias contestadas

O estudo refuta com precisão muitos dos discursos usados por políticos e dados manipulados para validar o “direito” de desmatar. Por exemplo, quem nunca ouviu dizer que o  Brasil é o país que mais protege áreas naturais? Ou que a agricultura é o setor que mais contribui para a conservação?

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Sobre a primeira questão, os pesquisadores revelam que a cobertura vegetal natural brasileira é estimada em aproximadamente 65 a 69% do território. Na lista de países de área florestal, classificada pelo Banco Mundial, o Brasil ocupa o 30º lugar (com 59% da cobertura florestal), depois de países com alto desenvolvimento socioeconômico, como Finlândia (73%) ou Suécia (69%). Considerando as terras naturais e semi-naturais, o Brasil ocupa apenas o 118-122° lugar (com 73% de cobertura) dos 300 países analisados.

Já sobre o argumento sobre o setor da agricultura é classificado como tendencioso. Isso porque grande parte da vegetação natural realmente está em terras particulares, mas isso não significa que estejam sendo preservadas. “Se observarmos não a extensão total da vegetação natural, mas focarmos em ganhos (regeneração) e perdas (conversão da vegetação nativa para outros usos), o Brasil acaba sendo o país com maiores perdas de vegetação natural do mundo e esses processos ocorrem em terras privadas. Nos últimos 30 anos, as perdas líquidas de vegetação natural em propriedades privadas ficaram acima de 20%, em comparação com apenas 0,5% em áreas protegidas e 5% em outras terras públicas. As taxas de desmatamento podem ser até 20 vezes menores em áreas protegidas ou em terras indígenas quando comparadas com terras privadas adjacentes”, detalha o estudo.

Outros mitos, alastrados sem filtro, são contestados como rigor científico. 

Combate a PL 

O estudo foi formulado como frente aberta ao projeto de lei n. 2362/19, que propõe que reservas legais não sejam mais obrigatórias. Mas o que são essas reservas? O Jornal da USP explica: As Reservas Legais são a porção de uma propriedade privada que precisa ser preservada com vegetação nativa, conforme determina o Código Florestal brasileiro (Lei 12.651/2012). Esse percentual varia de acordo com o bioma em que a propriedade se encontra: na Amazônia, é de 80%. Numa propriedade de 100 hectares localizada no Estado do Amazonas, por exemplo, significa que 80 hectares têm de ser obrigatoriamente preservados com vegetação nativa, enquanto que os outros 20 hectares podem ser desmatados para construir casas, plantar soja, criar gado ou seja lá o que for. Nas áreas de Cerrado localizadas dentro da Amazônia Legal, esse índice é de 35%; e em todo o resto do país, 20%. 

Atualmente, há 167 milhões de hectares de Reserva Legal, que somadas aos 100 milhões de hectares de vegetação nativa em áreas privadas que já podem ser legalmente desmatados deixaria exposto uma área do tamanho da Argentina – 270 milhões de hectares. 

Estudo completo (em inglês).