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Temperatura no Xingu é 5°C menor do que em áreas desmatadas

Proteção da floresta por povos indígenas tem efeito semelhante em toda a Amazônia Legal, aponta novo estudo

temperatura Xingu
Povos indígenas protegem a floresta amazônica, contribuindo com o equilíbrio climático do país. | Foto: Sara Leal/IPAM

O Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) recentemente divulgou que houve aumento de temperaturas máximas diárias de até 3°C em algumas regiões do Brasil nos últimos 60 anos. É uma evidência das alterações nos padrões de temperatura. Além das mudanças climáticas, fatores como urbanização e mudanças no uso e na cobertura da terra contribuem para esta subida e uma prova disso é o Território Indígena do Xingu, cuja temperatura média anual é 5°C menor do que a registrada no entorno, onde predominam monoculturas e pastagens, que podem chegar a 40°C.

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O efeito de “ar-condicionado” no Xingu, proporcionado pela proteção da floresta por povos indígenas, se repete em toda a Amazônia Legal: terras indígenas têm 2°C a menos de temperatura em comparação com áreas não protegidas.

Os dados são de uma nota técnica do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) em parceria com o Centro de Pesquisa em Clima Woodwell.

Evapotranspiração

A explicação para a diferença de temperatura está na evapotranspiração, um serviço ecossistêmico prestado pela vegetação nativa que funciona como uma “chuva às avessas”. No Território Indígena do Xingu, a evapotranspiração é quase três vezes maior do que em áreas desmatadas: a floresta viva e saudável dentro da terra indígena consegue bombear até 1.440 milímetros de água (por metro quadrado) ao ano para a atmosfera – no entorno, onde foi desmatada, não passa de 540 milímetros.

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Foto: Σ64  / Wikimedia Commons / CC BY 3.0

O estudo calcula uma evapotranspiração 9% maior em áreas ancestralmente ocupadas por povos indígenas em toda a Amazônia Legal em relação a áreas não protegidas. A porcentagem pode parecer pequena, mas as dimensões que representam são suficientes para alterar o regime regional de chuva.

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Impacto do Marco Temporal

Para as pesquisadoras, além da perda dos direitos originários territoriais, a aprovação do projeto de lei e validação da tese do marco temporal reduziriam “drasticamente a umidade e as chuvas na região” amazônica.

“O Estado brasileiro tem um enorme passivo para demarcar terras indígenas. A aprovação do PL 2903 e da tese do Marco Temporal significa aumentar ainda mais a dívida histórica do país com os povos originários e, em seu bojo, traz também riscos climáticos que colocam em xeque o nosso futuro”, diz Martha Fellows, coordenadora no núcleo de estudos indígenas do IPAM e autora do estudo.

indígenas florestas
Mulheres e crianças em trilha dentro da floresta que cerca a aldeia Ikpeng, no Xingu, à procura de árvores com sementes. Foto: Ayrton Vignola

A nota técnica mostra que terras indígenas na Amazônia Legal guardam 55 bilhões de toneladas de carbono, o equivalente a 26 anos de emissões brutas do Brasil. Com a possibilidade de avanço de atividades ilegais sobre essas áreas, apresentada pelas medidas em tramitação, tal estoque estaria comprometido, assim como as metas climáticas do país. “As metas brasileiras de redução de emissões, ou o compromisso com desmatamento zero até 2030 na Amazônia, cairão por terra”, constata um trecho do texto.

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Se aprovadas, as propostas dariam início a consequências em cascata, elenca o estudo, partindo do risco à vida dos povos originários, passando pela ameaça à produção de alimentos no Brasil, até o equilíbrio climático.

O aumento do desmatamento e da degradação na floresta amazônica, impactos socioambientais ligados ao PL 2903 e à tese do Marco Temporal, causaria alterações no regime de chuvas e na aridez do ar, rompendo com a segurança hídrica da Amazônia e do país. Leia o novo estudo na íntegra.

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Imagem do filme “Raoni”, de Jean-Pierre Dutilleux e Luiz Carlos Saldanha

A publicação é a segunda da série iniciada em junho, pelo IPAM, com análises que calculam os riscos impostos aos direitos indígenas, à biodiversidade e ao clima pelo PL 2903/2023, em pauta no Senado Federal, e pela tese do Marco Temporal das terras indígenas, em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal).

A continuação do julgamento no STF está marcada para 20 de setembro. Cinco ministros ainda não votaram. No Senado, a matéria está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.