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Composto de planta brasileira combate leishmaniose e doença de Chagas

Originária da Mata Atlântica, a planta é popularmente conhecida como canela-seca ou canela-branca (Nectranda leucantha).

Elton Alisson | Agência FAPESP

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Um composto natural isolado de uma planta originária da Mata Atlântica, popularmente conhecida como canela-seca ou canela-branca (Nectranda leucantha), pode resultar em novos medicamentos para o tratamento da leishmaniose visceral e da doença de Chagas.

Pesquisadores do Instituto Adolfo Lutz constataram em um estudo apoiado pela FAPESP que substâncias derivadas de uma molécula da planta, pertencente ao grupo das neolignanas, são capazes de combater os parasitas transmissores dessas doenças que afetam milhões de pessoas no Brasil e em outros países em desenvolvimento.

Os resultados do trabalho foram publicados na revista Scientific Reports e no European Journal of Medicinal Chemistry.

“Observamos que os compostos foram altamente potentes contra a Leishmania infantum, causadora da leishmaniose visceral, e o Trypanosoma cruzi, transmissor da doença de Chagas”, disse André Gustavo Tempone, pesquisador do Centro de Parasitologia e Micologia do Instituto Adolfo Lutz e coordenador do estudo, à Agência FAPESP.

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Os pesquisadores da instituição têm se dedicado nos últimos anos a identificar compostos provenientes da biodiversidade da Mata Atlântica que possam resultar no desenvolvimento de novos fármacos para combater doenças negligenciadas – causadas por agentes infecciosos ou parasitas e que afetam principalmente as populações mais pobres.

A planta é popularmente conhecida como canela-seca ou canela-branca (Nectranda leucantha). | Fotos: Germano Woehl Junior / Instituto Rã Bugio

Durante um projeto em colaboração com João Henrique Ghilardi Lago, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), foi possível isolar a neolignana.

Já por meio de um projeto em colaboração com colegas da Ohio State University, também apoiado pela FAPESP, foi possível avaliar e comprovar o efeito do composto sobre células do sistema imunológico.

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Agora, em um projeto em colaboração com Edward Alexander Anderson, professor da Universidade de Oxford, da Inglaterra, também apoiado pela FAPESP na modalidade São Paulo Researchers in International Collaboration (SPRINT), foram sintetizados 23 novos compostos derivados da molécula.

“Uma das limitações no desenvolvimento de novos fármacos para o tratamento de doenças negligenciadas é encontrar parceiros para fazer a síntese dos compostos promissores. A colaboração com o grupo da Universidade de Oxford possibilitou darmos esse passo”, disse Tempone.

Os pesquisadores avaliaram os efeitos dos compostos derivados da molécula em células de Leishmania infantum. Os resultados das análises indicaram que quatro deles se mostraram capazes de atingir a mitocôndria do parasita, que é um potencial alvo molecular de um fármaco para combatê-lo.

Diferentemente de humanos, que podem ter até 2 mil mitocôndrias, a Leishmania infantum possui apenas uma, explicou Tempone. “Constatamos que os compostos tiveram uma forte atuação na mitocôndria desse parasita”, afirmou.

Os compostos provocam um aumento abrupto do nível de cálcio no interior das células da Leishmania infantum. Essa alteração causa uma perturbação na mitocôndria do parasita, provocando sua morte.

“Nossa hipótese é que os compostos interferem drasticamente na liberação do cálcio no interior das células e, dessa forma, prejudicam a principal fonte de armazenamento de energia do parasita, que é a ATP [adenosina trifosfato], produzida pela mitocôndria”, disse Tempone.

Os compostos também interferiram no ciclo celular da leishmania, induzindo um mecanismo semelhante à morte celular programada e afetando a replicação do DNA. Efeitos similares também foram observados em ensaios com Trypanosoma cruzi.

“Também verificamos que a mitocôndria do Trypanosoma cruzi sofre uma alteração logo no início da incubação dos compostos pelo parasita”, disse Tempone.

Os pesquisadores pretendem, agora, otimizar os compostos, de modo a assegurar sua biodisponibilidade adequada no organismo. Essa etapa de avaliação da eficácia e segurança das moléculas é crucial para avançar para os estudos com animais, uma vez que mais de 90% dos compostos candidatos a fármacos testados in vitro (em células) falham nessa fase, explicou Tempone.

Pesquisadores constataram que substâncias da planta são capazes de combater os parasitas transmissores dessas doenças. | Fotos: Ana Claudia Torrecilhas e J. P. Maçaneiro/Flora Digital

“Estamos otimizando os compostos por meio da química medicinal para que possamos aumentar a taxa de sucesso nos estudos em modelo animal. Mas os compostos que obtivemos já são protótipos bastante promissores para combater a leishmaniose e atendem às recomendações da DNDi [organização sem fins lucrativos de pesquisa e desenvolvimento de medicamentos para doenças negligenciadas]”, disse Tempone.

Uma das recomendações da iniciativa internacional é que os compostos promissores para o tratamento de doenças negligenciadas sejam fáceis de serem sintetizados. “A síntese dos compostos que estamos estudando é simples, feita em cinco etapas, e são baratos”, disse Tempone.

O artigo A semi-synthetic neolignan derivative from dihydrodieugenol B selectively affects the bioenergetic system of Leishmania infantum and inhibits cell division (doi: 10.1038/s41598-019-42273-z), de Maiara Amaral, Fernanda S. de Sousa, Thais A. Costa Silva, Andrés Jimenez G. Junior, Noemi N. Taniwaki, Deidre M. Johns, João Henrique G. Lago, Edward A. Anderson e Andre G. Tempone, pode ser lido na Scientific Reports em www.nature.com/articles/s41598-019-42273-z.

Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.