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Em 38 anos, um em cada quatro hectares do Brasil pegou fogo

Mais de dois terços da área queimada foi de vegetação nativa, segundo o MapBiomas Fogo

Published 21/06/2024
fogo Amazônia

Coluna de fogo avança sobre floresta degradada em Porto Velho, Rondônia. Foto: Christian Braga | Greenpeace

Quase um quarto (23%) do território nacional foi queimado pelo menos uma vez no Brasil entre os anos de 1985 e 2023. O dado mais exato contabiliza 199,1 milhões de hectares queimados, segundo a mais recente Coleção do MapBiomas Fogo. Mais de dois terços da área afetada por fogo (68,4%) foi de vegetação nativa; aproximadamente um terço (31,6%) em área antropizada, como pastagem e agricultura. Quase metade (46%) da área queimada está concentrada em três estados: Mato Grosso, Pará e Maranhão e 60% de toda área queimada aconteceu em imóveis privados.

A cada ano, uma média de 18,3 milhões de hectares, ou 2,2% do país, são afetados pelo fogo. A estação seca, entre julho e outubro, concentra 79% das ocorrências de área queimada no Brasil, sendo que setembro responde por um terço do total (33%). Os dados do MapBiomas Fogo mostram também que cerca de 65% da área afetada pelo fogo no país foi queimada mais de uma vez em 39 anos, sendo o Cerrado o bioma com a maior quantidade de área queimada recorrente.

Imagem: MapBiomas Fogo

Os dados mostram padrões históricos claros sobre o quê, quando e quanto queima no Brasil todos os anos, o que permite ao poder público entender as tendências, identificar as áreas de maior risco e estabelecer ações coordenadas e mais eficientes de combate às queimadas. Nesse sentido, o Cerrado e a Amazônia, que juntos representam a maior parte da área queimada no país, apresentam características e desafios únicos que demandam abordagens específicas.

Juntos, o Cerrado e a Amazônia concentraram cerca de 86% da área queimada pelo menos uma vez no Brasil em 39 anos. No Cerrado, foram 88,5 milhões de hectares, ou 44% do total nacional. Na Amazônia, queimaram 82,7 milhões de hectares (42%). Embora Cerrado e Amazônia tenham números absolutos semelhantes de área queimada, esses biomas têm tamanhos diferentes. Por isso, no caso do Cerrado, a área queimada equivale a 44% de seu território; na Amazônia, esse percentual foi de 19,6%, ou seja, um quinto da extensão do bioma.

Imagem: MapBiomas Fogo

“A Amazônia enfrenta um risco elevado com a ocorrência de incêndios devido à sua vegetação não ser adaptada ao fogo, agravando o nível de degradação ambiental e ameaçando a biodiversidade local, enquanto a seca histórica e as chuvas insuficientes para reabastecer o lençol freático intensificam a vulnerabilidade da região”, explica Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Fogo e diretora de Ciências do IPAM. “O Cerrado tem sofrido com altas taxas de desmatamento, o que resulta no aumento de queimadas e no risco de se tornarem incêndios descontrolados, alterando o regime natural do fogo. Essas mudanças impactam negativamente o equilíbrio ecológico, pois o fogo, embora seja um componente natural do Cerrado, está ocorrendo com uma frequência e intensidade que a vegetação não pode suportar”, explica Vera Arruda, coordenadora técnica do MapBiomas Fogo e pesquisadora do IPAM.

A diferença entre os biomas não se resume aos números, mas também às características do fogo. Na Amazônia, o fogo é causado principalmente pelo desmatamento e práticas agrícolas. Como se trata de um bioma extremamente sensível ao fogo, o resultado é uma grande perda de biodiversidade. Já no caso do Cerrado, o bioma é adaptado ao fogo, pois evolutivamente ele depende de queimadas naturais e controladas para manter seu ecossistema. Porém os números mostram que atualmente ele enfrenta mudanças no seu regime natural de fogo relacionadas à expansão agropecuária e uso indevido do fogo.

Imagem: MapBiomas Fogo

O bioma que mais queimou proporcionalmente a sua área nos 39 anos avaliados foi o Pantanal, com 9 milhões de hectares. Embora sejam apenas 4,5% do total nacional, são 59,2% do bioma. Em 2023, foram mais de 600 mil hectares queimados no Pantanal, 97% dos quais ocorreram entre setembro e dezembro. O mês de novembro concentrou 60% do total da área queimada. O Pantanal, também adaptado ao fogo, enfrenta incêndios intensos principalmente devido às secas prolongadas, em função das dificuldades de contenção das queimadas, qualquer foco pode gerar impactos significativos na fauna e flora locais.

A área queimada na Caatinga entre 1985 e 2023 foi de quase 11 milhões de hectares. Isso equivale a 6% do total nacional e 12,7% do bioma. Nesse bioma, as queimadas são frequentemente usadas para manejo agrícola e exacerbadas por secas prolongadas, com muitas espécies vegetais mostrando adaptações ao fogo.

Imagem: MapBiomas Fogo

Na Mata Atlântica, foram cerca de 7,5 milhões de hectares (4% do total nacional e 6,8% em relação à extensão do bioma). A Mata Atlântica é altamente sensível ao fogo nas áreas naturais remanescentes. Sua fragmentação florestal e urbanização vêm aumentando a vulnerabilidade a incêndios, que ameaçam sua biodiversidade.

No Pampa, foram 518 mil hectares, ou 2,7% de seu território. Nesse bioma, onde predomina a vegetação campestre, as queimadas são pequenas e pouco frequentes, já que o seu uso para o pastejo dos rebanhos bovinos resulta em baixo acúmulo de biomassa inflamável. As maiores queimadas costumam ocorrer em anos do fenômeno climático La Niña.

Área queimada em Alter do Chão. Foto: João Marcos Rosa | Nitro

Além da adição da área queimada em 2023, um novo dado da Coleção 3 é o tamanho das cicatrizes, que contabiliza a área afetada por um único evento de fogo. As áreas queimadas entre 10.000 e 50.000 hectares são predominantes no Pantanal, com cerca de 25% das áreas afetadas. Já no caso do Cerrado, predominam queimadas em áreas entre 1.000 e 5.000 hectares, que respondem por 20% do total. Na Amazônia, predominam as áreas entre 100 e 500 hectares, que representam cerca de 20% do total afetado pelo fogo nesse bioma. Áreas inferiores a 10 ha ou entre 10 e 50 hectares são predominantes na Caatinga e Mata Atlântica. No caso do Pampa, mais de 54% das áreas queimadas são menores que 10 hectares.

Os três municípios que mais queimaram entre 1985 e 2023 foram Corumbá (MS), no Pantanal, seguido por São Felix do Xingú (PA), na Amazônia, e Formosa do Rio Preto (BA), no Cerrado.

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