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O pescado que comemos impacta a saúde dos oceanos?

Veja como as nossas escolhas podem proteger espécies ameaçadas e garantir a sustentabilidade dos recursos marinhos

Published 02/08/2022
reserva marinha portugal atum

A pesca é uma das grandes ameaças aos ecossistemas marinhos. Foto: Kate | Unsplash

Você sabe de onde vem o peixe que você consome? É muito provável que não, mas diante da crescente preocupação com a origem dos alimentos, tanto em relação à qualidade quanto aos impactos socioambientais que nossas escolhas causam ao planeta, vale a pena entender como a pesca predatória e a sobrepesca são consideradas grandes desafios para a saúde do oceano.

Esse é, inclusive, um apontamento da Organização das Nações Unidas (ONU). Se a desinformação persistir, corremos o risco de levar espécies à extinção, provocando desequilíbrios entre espécies e crise socioeconômica para as comunidades de pescadores.

O estudo Estado Mundial da Pesca e da Aquicultura, publicado a cada dois anos pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO, do inglês) revela que o consumo mundial de pescados mais que dobrou nas últimas três décadas.

Foto: Pixabay

Relatório divulgado em 2020 pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) informa que, em 2018, cerca de 88% da produção mundial de peixes foi direcionada para consumo humano, o que representa 156 milhões de toneladas.

O maior problema, no entanto, não é o volume crescente do consumo e sim a forma como peixes e frutos do mar são capturados. Estima-se que um terço da pesca seja feita de forma abusiva ou predatória, ou seja, insustentável. Fazem parte desta lista diversas espécies de raia e tubarão (cação), o bagre-marinho e o bagre-branco, o atum-azul, dentre outras que estão em situação crítica na costa brasileira, conforme indica portaria do Ministério do Meio Ambiente.

Brasil

No Brasil, um agravante para esse quadro é o apagão de estatísticas. Para Alexander Turra, membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza (RECN) e pesquisador do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP), o país necessita de políticas públicas atualizadas e gestão mais eficiente da atividade pesqueira.

“Embora alguns estados tenham boas práticas, em nível federal percebemos ausência de dados sobre estoques de pescados e o abandono do monitoramento de desembarques pesqueiros há mais de 10 anos. Infelizmente, não temos informações e estatísticas nacionais atualizadas, o que nos leva a uma gestão às cegas. Sem políticas públicas baseadas em dados para garantir a sustentabilidade da pesca, poderemos chegar a um colapso em breve”, alerta Turra.

Em 2018, o ICMBio listou no Brasil 98 espécies de peixes marinhos com algum grau de ameaça, sendo 34 espécies criticamente ameaçadas de extinção.

Foto: Pixabay

Sem acompanhamento do poder público, os problemas tendem a se agravar. “A sustentabilidade na pesca pressupõe definições sobre petrechos que podem ser usados, a quantidade de embarcações permitidas em cada área, quantidade e especificações do que se pode pegar, o tamanho dos animais que podem ser capturados, os locais corretos para pescar, o período certo, a metodologia adequada, enfim, uma série de regras que precisam ser estabelecidas e, principalmente, seguidas”, frisa Turra.

A pesca sustentável traz benefícios sociais, econômicos e ecológicos. Conforme destaca o especialista, é necessário respeitar os ecossistemas marinhos e se adaptar ao ritmo reprodutivo dos peixes e outros recursos pesqueiros para manter o equilíbrio e garantir a sobrevivência de todas as espécies.

“Além de gerar consequências econômicas para os pescadores e suas comunidades, a pesca predatória, feita acima da capacidade de reposição dos estoques, gera efeitos nocivos ao longo do ecossistema, comprometendo as cadeias alimentares e trazendo riscos à vida de várias espécies”, explica.

Carne de cação?

Photo by Jonas Allert on Unsplash

A abundância global de tubarões e raias oceânicas diminuiu quase três quartos (71%) nos últimos 50 anos, principalmente devido à pesca excessiva, segundo o estudo “Meio século de declínio global de tubarões e raias oceânicos”. Três quartos (75%) das espécies de tubarões e raias oceânicas são considerados em ameaçadas de extinção, segundo critérios da Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN).

Embora alguns tubarões e raias sejam capturados incidentalmente pela pesca, muitos deles são direcionados para o comércio global de nadadeiras. Felizmente a prática do finning, que consiste na retirada e venda apenas das nadadeiras dos tubarões, descartando os corpos no oceano, muitas vezes ainda com vida, está proibida em muitos países, inclusive no Brasil.

Mas, o que “sobra” e que não pode mais ser devolvido ao mar é vendido como carne de “cação”, um consumo crescente em países em desenvolvimento como Brasil e México. Desta maneira, o consumo de carne de cação permite que o comércio de barbatanas continue.

Para agravar a situação, no Brasil não é exigida a rotulagem correta em nível de espécie para tubarões e raias – ou seja, o “cação” vendido no país pode ser a carne de espécies criticamente ameaçadas e proibidas de comercialização, como os tubarões-martelo e raias-viola.

Além de tudo, a carne de tubarão e raia pode ser prejudicial à saúde, uma vez que eles acumulam em grandes quantidades contaminantes orgânicos como pesticidas, metais e derivados de petróleo.

Consumo consciente

Não é só o poder público que precisa fazer sua parte. Os consumidores também podem contribuir bastante para uma mudança deste cenário. Entre os cuidados práticos estão evitar o consumo de cação, pois pode ser carne de uma espécie de tubarão ameaçada; pesquisar iniciativas e selos na sua região que garantam a procedência do pescado; e questionar mercados, restaurantes e peixarias sobre a origem do pescado que comercializam.

Em 2017, a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) listou 455 espécies de peixes criticamente ameaçadas de extinção, incluindo 87 marcadas como possivelmente extintas. Para piorar, estima-se que na pesca e na aquicultura, cerca de 35% do que é coletado mundialmente seja desperdiçado ou perdido.

Foto: iStock
Alexander Turra respondeu algumas perguntas sobre o consumo consciente de pescados. Confira!

É fato que a forma como cada um de nós consome pescados impacta na saúde do oceano. Precisamos de consumidores cada vez mais conscientes e exigentes, além de gestão e práticas pesqueiras sustentáveis, para evitar que espécies marinhas desapareçam e não haja escassez de recursos vindos do mar.

Se a sua escolha é seguir consumindo pescado e frutos do mar, veja com atenção o infográfico abaixo:
Fonte: Fundação Grupo Boticário
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