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Um ano após tragédia, MP diz que Samarco não tem interesse em tirar rejeitos de Mariana

Os promotores ainda acusam a empresa de se apropriar das áreas atingidas pela lama como se fossem delas.

Published 07/11/2016

Foto: Corpo de Bombeiros

O Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) apresentou na última semana um balanço de seu trabalho relacionado às consequências do rompimento da barragem de Fundão, que ocorreu no dia cinco de novembro de 2015, no município de Mariana (MG). Os promotores acusam a mineradora Samarco, responsável pela barragem, de não ter interesse em remover a lama espalhada. Também criticaram o acordo entre a empresa e a União e se disseram preocupados com o risco de uma tragédia processual.

Considerado a maior tragédia ambiental do país, o episódio completou um ano. Foram liberados no ambiente mais de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos, devastando vegetação nativa, poluindo a bacia do Rio Doce e destruindo os distritos de Bento Rodrigues, Paracatu e Gesteira, além de outras comunidades.

O MPMG acusa a Samarco de descumprir diversos acordos. No dia 16 de novembro do ano passado, 11 dias após a tragédia, a mineradora assinou um Termo de Compromisso Preliminar que fixou em R$1 bilhão a quantia mínima a ser gasta exclusivamente com medidas emergenciais. Segundo o promotor Mauro Ellovitch, até hoje todo o recurso despendido pela empresa não chegou a esse valor. A Samarco não informou quanto investiu especificamente em medidas emergenciais. Ao todo, a empresa alega que já empregou R$ 1,1 bilhão para o pagamento de ações de remediação, compensação e de indenização.

Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Medidas pendentes

Para o promotor, há medidas emergenciais pendentes que a Samarco e suas acionistas Vale e BHP Billiton só farão se forem obrigadas judicialmente. Entre elas, está a retirada dos sedimentos das margens dos rios, das áreas estaduais de preservação permanente e das comunidades afetadas. Atualmente, há 43,5 milhões de metros cúbicos de sedimentos dispersos entre a barragem de Fundão e à Usina Hidrelétrica de Candonga.

A Samarco diz que a remoção dos sedimentos está em discussão com os órgãos ambientais. Por enquanto, rejeitos estão sendo removidos apenas da Usina de Candonga e do município de Barra Longa (MG).

Foto: GlobalGeo

Segundo a mineradora, está prevista ainda a retirada de cerca de um milhão de metros cúbicos na região de Bento Rodrigues. Por enquanto, não houve remoção da lama no distrito. O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) coordena a Câmara de Rejeitos do Comitê Interferativo, estrutura criada para fiscalizar as ações de reparação dos danos da tragédia.

“Tecnicamente, em muitas áreas, não é recomendável a retirada de parte dos sedimentos. Precisa haver um estudo com justificativa técnica sobre porque retirar o rejeito ou porque deixá-lo ali”, diz o superintendente do órgão, Marcelo Belisário. No entanto, ele diz que houve remoção de rejeitos em alguns pontos de Bento Rodrigues, gerando um desencontro com as informações prestadas pela Samarco.

Motivos econômicos

Na opinião do promotor Mauro Ellovitch, a empresa não teria interesse em retirar os rejeitos por motivos econômicos. “Querem consolidar essa lama no local, plantar gramíneas e outro tipo de vegetação para, daqui a dois anos, dizerem que está tudo verdinho e que não há mais necessidade da retirada. Mas com todo este rejeito, as áreas de preservação permanente jamais vão conseguir recuperar todas as funções ecossistêmicas de garantia de abastecimento dos cursos d’água, de estabilização geológica, de biodiversidade”, diz Mauro Ellovitch.

Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Segundo o promotor do patrimônio cultural do MPMG, Marcos Paulo, a retirada de 1 milhão de metros cúbicos de rejeitos da área de Bento Rodrigues foi acertada em um acordo judicial com a Samarco no dia 8 de agosto. O distrito, que atualmente tem cerca de 2,8 milhões de metros cúbicos dispersos, concentra o maior número de bens culturais ainda submersos. Também era previsto no acordo o resgate dos pertences dos antigos moradores que estão sobre e sob a lama, como álbuns de família, retratos, cartas, troféus, etc. “Infelizmente a empresa não tirou uma pá de lama até hoje. Ao contrário, a Samarco começou a realizar o plantio de gramas sobre as propriedades das vítimas”.

Em um balanço dos trabalhos do Comitê Interfederativo feito no mês passado, a presidente do Ibama, Suely Araújo, disse que estava prevista uma revegetação inicial de 800 hectares com gramíneas e leguminosas. A vegetação teria o objetivo de combater processos erosivos em curso.

Nova ação

Na última semana, o MPMG ajuizou nova ação pedindo que a Samarco seja obrigada a remover e providenciar destinação final ambientalmente adequada aos sedimentos depositados nas calhas e margens do Rio Gualaxo do Norte, do Rio do Carmo e do Rio Doce, entre outros pontos. Um dos poucos locais onde está havendo retirada de rejeitos é Barra Longa (MG). Segundo a mineradora, foram removidos 157 mil metros cúbicos de rejeitos, paralelamente a um processo de recuperação da área urbana impactada. As ações no município têm sido utilizadas pela Samarco como vitrine de seu trabalho de reparação aos danos da tragédia. No dia 30 de outubro, ocorreu a inauguração da Praça Manoel Lino Mol.

Mesmo assim, o MPMG tem críticas. “Eles retiram os sedimentos das praças e das ruas e estão depositando no Parque de Exposições do município, que fica em área de preservação permanente, à beira do curso d’água”, diz o promotor Bruno Guerra. Ele diz que o rejeito, ao secar, vira poeira e tem causado problemas respiratórios em habitantes do município. A Samarco informa que os rejeitos foram colocados no Parque de Exposições num primeiro momento e, posteriormente, em uma área devidamente licenciada fora da cidade. Atualmente, apenas 30 mil metros cúbicos estariam no Parque de Exposições e servirão de base para a construção de um campo de futebol.

Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil

Na Usina Hidrelétrica de Candonga, que após a tragédia passou a funcionar como uma barragem para contenção de rejeitos, está sendo feita uma dragagem emergencial. Estimativas do Ibama apontam que há 9,5 milhões de metros cúbicos no local. Um acordo entre a Samarco e o MPMG celebrado em julho estabeleceu como meta a retirada de todo o sedimento do reservatório até este mês. No entanto, segundo os promotores, apenas um terço foi retirado até agora.

Na versão da Samarco, foi assumido o compromisso com os órgãos ambientais de retirar até 1,3 milhão de metros cúbicos, sendo que 500 mil metros cúbicos de rejeito já teriam sido dragados e o restante será retirado até julho de 2017.

Dique

Para o promotor, um plano de recuperação da área degradada, com a remoção dos rejeitos, seria exequível num prazo de 18 a 35 meses. “Se a empresas quisesse, esse processo já poderia estar em andamento. E agora, no período de chuva, não haveria a preocupação desses sedimentos serem novamente carreados para os cursos d’água, como vai ocorrer. E nem seria necessário construir uma estrutura que vai inundar Bento Rodrigues”, diz Mauro Ellovitch.

Ellovitch faz referência às obras do Dique S4, autorizada no dia 21 de setembro através de um decreto do governo estadual, que o considera fundamental para conter os rejeitos. O MPMG e os antigos moradores dos distritos não são favoráveis à construção.

O promotor Marcos Paulo critica o governo estadual. “As empresas se apropriaram da área atingida como se proprietárias fossem desde o dia seguinte à tragédia. E vem um decreto estadual e chancela uma requisição administrativa sobre propriedade de terceiros sem uma justificativa técnica plausível. Estamos lutando contra grandes interesses econômicos e políticos”, diz.

Por Léo Rodrigues – Agência Brasil

 

 

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