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MP da Grilagem se transforma em Projeto de Lei

Campanha pede que votação do PL 2633/20 só aconteça depois da pandemia

Published 19/05/2020
PL da Grilagem

Foto: ISA

Na semana passada a votação da MP910/2019, conhecida como MP da Grilagem, gerou grande mobilização e protestos. Como explicamos em matéria publicada no CicloVivo, a MP foi anunciada como uma ação de ajuda a pequenos posseiros. O que se revelava, na verdade entanto, era um artifício legal para anistiar grandes invasores e desmatadores,

Estão em risco mais de 60 milhões de hectares de terras públicas. A Amazônia e o Cerrado, que concentram a maior parte das terras da União, são especialmente ameaçados – um território é maior do que o estado da Bahia.

Foto: Fábio Nascimento | Greenpeace

Segundo organizações ambientais que criticam o texto do relator, o deputado Marcelo Ramos (PL-AM), o Projeto de Lei repete equívocos da MP 910 e pode intensificar o desmatamento ilegal e a grilagem de terras públicas, além de ameaçar povos indígenas, pequenos agricultores e quilombolas (veja abaixo).

Campanha pede votação após a pandemia

Entre as críticas ao PL da Grilagem, como foi apelidado, está o fato do Projeto de Lei ser uma das prioridades da agenda da Câmara dos Deputados nesta semana, justamente quando a população não pode se manifestar e as preocupações estão voltadas à pandemia.

“Estamos na véspera do período criminoso de queimadas na Amazônia e o deputado Marcelo Ramos está correndo para votar o PL da Grilagem, que estimula desmatadores. Não bastasse o sofrimento da população com os problemas respiratórios do vírus, a situação pode se agravar ainda mais pela fumaça das florestas em chamas”, alerta Mariana Mota, da campanha de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil. 

Para que a votação não aconteça sem o debate que merece, um grande grupo de artistas, entre eles Caetano Veloso, Beth Faria, Alessandra Negrini, Daniela Mercury, Burno Gagliasso e Malu Mader gravaram um vídeo pedindo ao deputado Marcelo Ramos (PL-AM) que não coloque o PL em votação durante a pandemia.

O que podemos fazer?

Quem quiser se posicionar contra a votação do PL2633/20 pode acessar o site Saldão da Amazônia, que oferece na própria plataforma, a possibilidade de envio rápido e simples de mensagens aos deputados pedindo que o PL não seja votado agora.

Outra forma de se posicionar é pressionar os deputados Rodrigo Maia, presidente da Câmara, e Marcelo Ramos, relator do projeto, nas redes sociais, marcando seus perfis em publicações ou enviando mensagens diretamente aos parlamentares.  

Twitter: 
@rodrigomaia 
@marceloramosam 

Instagram: 
https://www.instagram.com/rodrigomaiarj/  
https://www.instagram.com/marceloramospl 

O uso das hashtags #PL2633Não, #GrilagemÉCrime e #GrilagemNão também é recomendado por organizações que articulam a oposição ao PL da Grilagem.

Riscos do PL 2633/20

A grilagem de terras públicas é uma das causas do desmatamento da Amazônia
Foto: Adriano Gambarini | WWF-Brasil

Segundo o relator, o texto do PL é diferente do proposta na MP 910. Mas, impostantes organizações já se posicionaram contra o que foi proposto.

Uma nota técnica do Projeto Clima & Sustentabilidade do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), identifica os principais riscos do texto do PL 2633 para o esforço de combate ao desmatamento e de conservação ambiental no Brasil, além de oferecer elementos para o aprimoramento do projeto.

Em nota oficial, o Observatório do Clima, uma rede composta por 50 organizações não governamentais, alerta para pontos problemáticos do projeto:

– Aumenta o risco de titulação de áreas sob conflito e contraria uma decisão do STF, já que amplia a dimensão dos imóveis com isenção de vistoria prévia sem reforçar medidas de fiscalização remota.

– O sensoriamento remoto não conseguirá comprovar ocupação mansa e pacífica, nem que o declarante não tomou terras de indígenas ou de outras populações tradicionais cujos territórios ainda não foram formalizados.

– Possibilidade de titular áreas desmatadas ilegalmente, já que aquelas que ainda não foram autuadas ou embargadas poderiam ser tituladas sem se exigir assinatura prévia de instrumento de regularização de passivo ambiental.

– Não traz novidade em termos de regularização fundiária, nem contribui para facilitar a vida de pequenos produtores rurais, que já contam na prática com regras flexíveis para regularizar suas propriedades.

– Pode estimular a ocupação de novas áreas visando obtenção de terra via licitação facilitada, já que o PL oferece amplia as definiçõ das regras para esse processo.

Grandes proprietários serão beneficiados

Outro ponto que levantou críticas foi o aumento de aumento de 2 hectares para a área a ser regulamentada além do limite já estabelecido por lei, uma vez que 95% dos pequenos agricultores moram em áreas de até 4 hectares.

A medida beneficia proprietários de grandes áreas, que somam 70% dos beneficiados com a regularização proposta. O PL 2633/20 não favorece agricultores familiares, indígenas e povos tradicionais e é inclusive uma ameaça para índios e quilombolas.

No Brasil a concentração de terras é uma das maiores do mundo e este projeto de lei vai contribuir ainda mais para aumentar a desigualdade social e injustiças no campo.

Invasores reincidentes também vão ser beneficiados uma vez que quem que já possui títulos de propriedade de áreas invadidas, vai poder legalizar novamente uma terra pública ocupada de forma ilegal.

Os invasores de terras públicas devem ser punidos e não premiados.
Foto: Bruno Taitson | WWF-Brasil

Povos ameaçados e violência

O modelo de regularização proposto dispensa vistoria e escolheu a auto declaração como instrumento. Para se declarar proprietário de uma terra, basta entrar no CAR (Cadastro Ambiental Rural) e se declarar dono da área. Com isso, as disputas, conflitos e questionamentos deve aumentar significativamente, o que inclui também o aumento de violência no campo.

Esta regularização por sensoriamento remoto, um dos tópicos mais conflituosos do debate, seria limitada a propriedades rurais com até seis módulos fiscais (MF), bem abaixo dos 15 MF propostos pela MP 910 como limite para esse procedimento. Além disso, segundo o relator, a regularização de MF contínuos em nome de parentes seria vetada para evitar fraudes.

Ainda de acordo com Marcelo Ramos,  o PL não ameaça Terras Indígenas e Quilombolas e Unidades de Conservação, mas hoje já existem reservas indígenas, quilombolas e reservas ambientais que foram declaradas como propriedade de grileiros no CAR.

Grilagem e desmatamento

A grilagem é responsável por grande parte do desmatamento no país. Os grileiros desmatam áreas públicas, e simulam a posse dos terrenos com documentos falsos. Normalmente, estas terras são vendidas a grandes proprietários de terra e destinadas a atividades agropecuárias.

É importante também que o prévio de desmatamento em áreas privadas foi o grande impulsionador das intensas queimadas na Amazônia em 2019. Além disso, no final do ano, o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) mostrou que 35% do desmatamento ocorrido na Amazônia entre agosto de 2018 e julho de 2019 foi registrado em “áreas não-designadas e sem informação”, ou seja, em terras griladas. Relembre aqui.

Área degradada no município de Colniza, noroeste do Mato Grosso.
Foto: Marcelo Camargo | Agência Brasil

Regularização Fundiária

“Não é só transferir terra para agricultor: regularizar significa, por exemplo, criar Unidades de Conservação em terras devolutas. Significa resolver a situação de 92 Terras Indígenas que ainda não estão homologadas na região. Significa criar assentamentos de reforma agrária”, defende o jornalista Claudio Angelo.

Ele publicou um importante artigo em que defende que a regularização fundiária não seja limitada às propriedades rurais, mas para todos os 123 milhões de hectares de glebas federais existentes apenas na Amazônia.

Segundo o WWF-Brasil, a regularização fundiária é importante e precisa acontecer, porém votar o PL neste momento impede a devida discussão que o tema merece. “É necessário diferenciar os posseiros legítimos dos criminosos que ocupam e desmatam as terras ilegalmente e geram violência. Dar um título de propriedade a quem reiteradamente invade, desmata, ocupa e vende terras públicas é beneficiar grileiros. Assim como anistiar a invasão de grandes áreas de terras públicas, ocorridas muito recentemente. Enquanto houver grilagem, jamais alcançaremos o desmatamento zero”, afirma a organização.

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