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Cerca de 1.500 onças foram mortas ou desabrigadas em 4 anos na Amazônia

Dia da Onça-Pintada é celebrado em 29/11 e lembra de que desafios para a conservação da espécie ainda são grandes no Brasil

Published 29/11/2021
onça-pintada

Foto: Edu Fragoso

A perda de habitat natural, provocada sobretudo pelo desmatamento, e a caça são hoje as principais ameaças para a sobrevivência das onças-pintadas, espécie-símbolo em situação de vulnerabilidade no Brasil.

Segundo um estudo publicado em junho de 2021 por cientistas brasileiros na revista “Conservation Science and Practice”, um total de 1.422 onças foram mortas ou deslocadas, considerando somente a região amazônica, onde a espécie é considerada vulnerável. O estudo foi realizado entre 2016 e 2019.

Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), entre agosto de 2020 e julho de 2021, meses em que se mede a temporada do desmatamento, a Amazônia Legal perdeu mais de 10 mil quilômetros quadrados de floresta, um aumento de 57% em relação ao período anterior e o pior desflorestamento dos últimos dez anos. Esse cenário, além de agravar o risco de extinção na região, provoca o deslocamento de animais.

“Onças são animais selvagens, que necessitam de um ambiente preservado amplo e robusto, capaz de suprir suas necessidades de deslocamento e alimentação. Tais condições são essenciais à sua sobrevivência.”

Roberto Fusco, biólogo membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza
Foto: Pixabay

De acordo com a avaliação do risco de extinção da onça-pintada do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a onça-pintada é amplamente distribuída na Amazônia, ocorrendo em aproximadamente 89% do bioma. Apesar da ampla distribuição, estimativas apontam que o tamanho populacional da espécie é inferior a 10 mil indivíduos.

Nos últimos 27 anos, houve um declínio de pelo menos 10% da população devido à perda e fragmentação de habitat e à eliminação de indivíduos por caça ou retaliação.

A preocupação com a espécie não se restringe à Amazônia. Ivan Baptiston, também integrante da RECN e analista ambiental do ICMBio, lembra que, no Brasil, as onças estão consideradas extintas no Pampa e criticamente ameaçadas na Mata Atlântica e na Caatinga. Segundo o especialista, restam aproximadamente 300 indivíduos na Mata Atlântica, espalhados pelos fragmentos que restaram do bioma.

A onça-pintada (Panthera onca) é o maior felino das Américas e o terceiro do mundo. Foto: iStock

“Exceto na ecorregião do Alto Paraná, no corredor verde entre Brasil e Argentina, onde a população resiste e tem aumentado, no restante do bioma a população de onças-pintadas se mantém a duras penas ou segue em decréscimo. Há muito a fazer para a garantia da existência de populações viáveis desta belíssima espécie”, explica.

Ações de conservação

Para divulgar a importância ecológica, econômica e cultural da onça-pintada, o Ministério do Meio Ambiente criou, em 2018, o Dia Nacional da Onça Pintada. A data – que agora será celebrada pela terceira vez no calendário oficial do País – também é reconhecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) como um dia internacional de proteção da espécie. Em razão do declínio populacional das onças-pintadas, projetos têm buscado a conservação do animal.

“O desaparecimento desses predadores pode gerar impacto em todo o ecossistema, por meio de um efeito cascata, que começa com o aumento de suas presas, geralmente herbívoros, que por sua vez impacta a composição e estrutura da vegetação.”

Roberto Fusco, biólogo membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza
Onça-pintada no Parque Nacional do Pantanal Matogrossense. Foto: Marcos Amend

“Essa bagunça no ecossistema pode trazer efeitos imprevisíveis, como a perda de biodiversidade, alteração na composição do solo, aumento de espécies exóticas e até mesmo na liberação de patógenos, o que pode potencialmente afetar a saúde humana”, alerta Roberto Fusco, biólogo membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

O especialista lançou, em 2020, juntamente com outras pesquisadoras, o Programa Grandes Mamíferos da Serra do Mar, que busca justamente monitorar a população desses animais ao longo de uma grande porção de Mata Atlântica e, assim, gerar dados mais sólidos sobre sua relação com os ecossistemas e subsidiar ações de conservação mais eficazes. O projeto é realizado pelo Instituto de Pesquisas Cananéia (IPeC) e Instituto Manacá, com apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, WWF-Brasil e banco ABN AMRO.

Além dessa iniciativa, outras ações têm ajudado na conservação das onças-pintadas no Brasil, como o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Carnívoros, o Instituto Onça-Pintada, o Projeto Onças do Contínuo de Paranapiacaba, o Onças do Iguaçu, o Projeto Felinos, a Associação Onçafari, o Programa Amigos da Onça, o Panthera Pantanal, o Ecologia e Conservação de Felinos na Amazônia e o Detetives Ecológicos do Instituto de Pesquisas Ecológicas.

Foto: Pixabay

Marion Silva, gerente de Ciência e Conservação da Fundação Grupo Boticário, reforça a importância de projetos e pesquisas que contribuam com a conservação dos habitats de espécies ameaçadas de extinção. “Além de gerarem conhecimento importante sobre as espécies, muitas dessas pesquisas destacam as oportunidades econômicas sustentáveis que a natureza preservada pode proporcionar, como a observação de fauna, que vem crescendo em nosso país e gerando emprego para populações tradicionais”, afirma.

Características

Originalmente, a onça-pintada podia ser encontrada desde o sudoeste dos Estados Unidos até o centro-sul da Argentina e Uruguai, habitando diferentes tipos de ambientes, de florestas tropicais e subtropicais até regiões semidesérticas, de preferência ambientes próximos de curso d’água.

Contudo, devido principalmente à perda de habitat por fatores antrópicos, atualmente a espécie é considerada extinta nos EUA, se restringindo às planícies costeiras do México, países da América Central (com exceção de El Salvador) e na América do Sul (exceto Uruguai). No Brasil, ela originalmente ocupava todos os biomas, mas não há mais relatos da espécie na região do Pampa.

A espécie tem a mordida mais forte entre todos os felinos do mundo. Foto: Pixabay

O corpo é revestido por pintas negras, formando rosetas com diferentes tamanhos, geralmente grandes com um ou mais pontos negros no seu interior. O aparecimento de indivíduos melânicos (onça-preta) não é raro, e mesmo nesses casos as rosetas podem ser vistas em contraste com a luz.

As onças têm hábito solitário, podendo ser ativas durante o dia e à noite. É um animal terrestre, mas escala árvores e nada muito bem. Se alimenta de vertebrados de médio e grande porte, como anta, porco-do-mato, veado, tamanduá, capivara, jacaré, quati, entre outros. Machos e fêmeas encontram-se apenas no período reprodutivo; geram em média dois filhotes que permanecem com a fêmea até os dois anos de idade. Os machos possuem territórios maiores, que podem se sobrepor aos de várias fêmeas.

Assim como outros grandes felinos, a onça-pintada requer uma grande área para sobreviver. Sua presença em grande densidade, portanto, serve como um indicador da qualidade de conservação daquele ecossistema.

Foto: SOS Pantanal
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